Musica e cibercultura.
Montenegro de Lima, Clovis Ricardo ; Santini, Rose Marie
No final do seculo XX iniciam-se globalmente mudancas historicas
que desmantelam muitas configuracoes sociais que marcam a Modernidade.
Ha mudancas nos regulamentos economicos e sociais, a reestruturacao de
formas organizacionais, a quebra de representacoes e expectativas. Ha
atualmente maior incerteza em relacao ao futuro e enfraquecimento dos
vinculos e das solidariedades sociais do trabalho.
Os processos de producao da informacao e do conhecimento tambem
mudam. Ganha maior dimensao a producao de informacao e de conhecimento
intensivos, de produtos personalizados, e de signos e imagens, em
contraposicao a producao de bens materiais padronizados. As
caracteristicas da sociedade industrial perdem forca com a
flexibilizacao globalizada das formas de organizacao social. A
convergencia de mudancas sociais e tecnologicas produz mudanca nas
relacoes de producao economica e de conhecimento. O processo social de
desenvolvimento cientifico e tecnologico tem implicacoes culturais e
politicas cumulativas, que mudam as formas de discutir, produzir e
organizar informacao, enfim, de agir e de representar a sociedade.
Castells (2001) observa que cada modo de desenvolvimento e definido
pelo elemento fundamental a promocao da produtividade no processo de
producao. No modo de desenvolvimento industrial, a principal fonte de
produtividade se encontra na introducao de novas fontes de energia e na
capacidade de descentralizacao do uso de energia ao longo dos processos
de producao e de circulacao. Na sociedade da informacao a fonte de
produtividade se encontra na tecnologia de geracao de conhecimentos, de
processamento da informacao e de comunicacao de simbolos.
O elemento essencial para a construcao da sociedade da informacao
no Brasil, de acordo com Miranda (2000), e a implantacao de uma solida
plataforma de telecomunicacoes, na qual possam difundir-se e florescer
as aplicacoes em areas de denso conteudo e de retorno social. Isto
requer a instalacao e fortalecimento de adequada infra-estrutura de
escolas, bibliotecas e laboratorios, a fim de que uma nova geracao de
brasileiros se prepare para o futuro.
A sociedade da informacao se desenvolve atraves da operacao de
conteudos sobre a infra-estrutura de conectividade. Miranda (2000)
afirma que o fenomeno que melhor caracteriza o funcionamento em rede e a
convergencia progressiva que ocorre entre produtores, intermediarios e
usuarios em torno de recursos, produtos e servicos de informacao afins.
Uma das contribuicoes mais relevantes da Internet e permitir que
qualquer usuario venha a ser produtor, intermediario e usuario de
conteudos. O alcance dos conteudos e universal, resguardadas as
barreiras linguisticas e tecnologicas do processo de difusao. E por meio
da operacao de redes de conteudos de forma generalizada que a sociedade
atual vai se mover para a sociedade da informacao.
A Internet inclui as pessoas nao somente como receptores passivos,
mas tambem como agentes ativos e determinantes, livres para escolherem o
conteudo, interagirem com ele, independentemente do espaco e do tempo em
que se localizam o usuario e os conteudos. A Internet enriqueceu o papel
do usuario, do cidadao, dotando-o com o potencial e a capacidade de
produtor e intermediario de conteudos (Miranda, 2000).
A convergencia tecnologica vem eliminando os limites entre os meios
de comunicacao, tornandoos solidarios em termos operacionais, e erodindo
as tradicionais relacoes que mantinham entre si e com seus usuarios. A
tecnologia digital torna possivel o uso de uma linguagem comum: tudo
pode ser transformado em digitos e distribuido por fios telefonicos,
fibras oticas e satelites ou ainda por via de um meio fisico de
gravacao, como discos digitais ou pen-drive. A digitalizacao torna o
conteudo totalmente plastico, isto e, qualquer mensagem, som ou imagem
pode ser editada, mudando de uma forma e suporte.
A tecnica participa ativamente da ordem cultural, afirma Levy
(1993). Quando uma circunstancia, como a mudanca tecnica, desestabiliza
o antigo equilibrio das forcas e das representacoes, estrategias
ineditas e aliancas inusitadas tornam-se possiveis. Uma infinidade de
agentes sociais explora as novas possibilidades, antes que uma nova
situacao se estabilize provisoriamente, com seus valores e sua cultura
locais. Usando uma expressao de Levy: a tecnica e uma "caixa de
Pandora metafisica".
Levy (1993) pensa que a presenca ou a ausencia de certas tecnicas
fundamentais da comunicacao permite classificar as culturas em algumas
categorias gerais. Esta classificacao apenas auxilia a localizar os
polos da historia. Nao deve fazer com que se esqueca que cada grupo
social, em dado instante, encontra-se em situacao singular e transitoria
frente as tecnologias intelectuais.
Os polos da oralidade, da escrita e da informatica nao sao eras, e,
observa Levy (1993), nao correspondem a epocas determinadas. A cada
instante e a cada lugar os tres polos estao sempre presentes, mas com
intensidade variavel. O uso de um determinado tipo de tecnologia
intelectual coloca enfase particular em certos valores, certas dimensoes
da atividade cognitiva ou imagem social do tempo, que se tornam entao
mais explicitamente focadas e discutidas e ao redor dos quais se
cristalizam formas culturais particulares.
Quando descreve e discute a formacao cultural atual, que denomina
de cibercultura, Levy (1999) afirma que existem tres grandes etapas da
historia da cultura: a das sociedades fechadas, de cultura oral; a das
sociedades civilizadas, usuarias da escrita; e a da cibercultura, que
corresponde a globalizacao concreta das sociedades. Cabe observar que
ele sublinha que a segunda e a terceira etapa nao eliminam a anterior:
relativizam-na, acrescentando-lhe dimensoes suplementares.
O quadro 1 apresenta alguns processos de deslocamento dos meios de
comunicacao e da cultura musical da modernidade para a sociedade da
informacao. A cena musical moderna esta profundamente vinculada as
series da industria cultural e a cultura de massas. A musica popular
moderna tem a forma de cancoes, que sao reproduzidas pelo fonografo e se
difundem pelo radio e televisao. Os discos de vinil registram as
celebridades e as estrelas populares. Os toca-discos ocupam espaco na
casa das familias modernas. Na cultura moderna a industria fonografica
produz e vende milhoes de discos em serie.
A cena musical da sociedade da informacao esta profundamente
vinculada as novas tecnologias de informacao e comunicacao. A musica
eletronica tem a forma de obra aberta, compactadas sob a forma de
arquivo MP3 e fluindo no espaco virtual da Internet. A criatividade
coletiva registra as suas colagens sonoras. Os CDs e os DVDs sao formas
transitorias de armazenamento de musica. Os aparelhos que tocam MP3 sao
o atual objeto de desejo de milhoes em todo o mundo. A musica se
dissemina na internet. Vivemos a expansao das web-radios, sites de
compartilhamento e redes P2P.
Levy (1993) adverte que nos falta recuo para avaliar de forma plena
todas as consequencias das mutacoes tecnologicas sobre a producao e a
economia da musica atual, sobre as praticas musicais e a aparicao de
novos generos. Cabe mencionar que a maior parte dos observadores esta de
acordo quanto a ver na emergencia dos instrumentos e dos meios
eletronicos e digitais uma ruptura comparavel a da invencao da notacao
ou ao surgimento do disco de vinil.
Comunicacao e cibercultura
A cibercultura e o conjunto de processos tecnologicos e sociais
emergentes a partir da decada de 70 do seculo XX, com a convergencia das
telecomunicacoes, da informatica e da sociabilidade contra-cultural da
epoca (Breton, 1990; Castells, 2001), que tem enriquecido a diversidade
cultural mundial e proporcionado a emergencia de culturas locais em meio
ao global supostamente homogeneizante. Uma das principais
caracteristicas dessa cibercultura planetaria e o compartilhamento de
arquivos, musica, fotos, filmes, etc., construindo processos coletivos
(Lemos, 2004).
Assistimos a emergencia de novas praticas comunicacionais no
ciberespaco (e-mails, listas, sites de relacionamentos, weblogs,
webcams, icq, chats), da arte eletronica, de novas formas de acao
politica (cibercidadania, ciberativismo, hackers), transformacoes
culturais e eticas (softwares livres, redes P2P, politicas de
privacidade) e uma nova configuracao comunicacional (liberacao do polo
da emissao) nos ambientes digitais de comunicacao.
A cibercultura pode ser compreendida como processo socio-tecnico da
atualidade, marcada basicamente por redes telematicas, sociabilidade
online e navegacao planetaria em busca de informacao (Lemos; Cunha,
2003). A cultura contemporanea esta marcada pela interacao
comunicacional. A cibercultura nao e determinada pela tecnologia:
tratase de uma relacao que se estabelece pela emergencia de novas
formacoes sociais e tecnologias digitais. Nao se trata de determinismo
tecnologico, isto e, de nomear epocas historicas pelos seus respectivos
conjuntos de artefatos, mas sim de fenomeno social que possui
potencialidades e negatividades a partir das tecnologias contemporaneas.
Quando tratamos das questoes relacionadas a musica na cibercultura,
podemos pensar no grau de penetracao da Internet no mundo, e
principalmente no Brasil, que ainda e restrita. Nao foi diferente em
relacao aos outros meios de comunicacao. Quando o radio ou a televisao
surge, seu acesso era um privilegio de poucos. Atualmente radio e TV
possuem penetracao de aproximadamente 95% na populacao brasileira.
Em relacao ao suportes utilizados pela industria cultural da
musica, por exemplo, percebemos claramente que os ciclos de vida do
vinil, da fita magnetica ou do CD duram de 15 a 25 anos, e assim surgem
sempre novos formatos para uso cultural, o que leva a
"reconfiguracao" dos suportes anteriores. Constatamos que as
novas tecnologias provocam acoes e reacoes significativas, que geram
adequacoes e novas formas de uso de recursos existentes.
Emerge na cibercultura uma Mass Self Communication (Castells, 2006)
que esta presente na Internet e tambem no desenvolvimento dos telefones
celulares. Estimase que existem atualmente mais de um bilhao de usuarios
de internet e cerca de dois bilhoes de linhas de telefonia celular no
mundo. Um terco da populacao do planeta pode se comunicar gracas aos
telefones celulares, inclusive em lugares onde nao ha energia eletrica
nem linhas de telefone fixo. Em pouco tempo houve a explosao de novas
formas de comunicacao. As pessoas desenvolveram seus proprios sistemas:
o SMS, os blogs, sistemas P2P, o skype, entre outros.
O Peer-to-Peer ou P2P (1) torna possivel a transferencia de
qualquer dado digitalizado, principalmente a musica. Em maio de 2006,
havia 37 milhoes de blogs (em janeiro de 2006, havia 26 milhoes). Em
media, um blog e criado por segundo no mundo, o que significa 30 milhoes
por ano. Aproximadamente 55% dos blogueiros continuam a alimentar seus
blogs ate tres meses depois deles terem sido abertos. A quantidade de
blogueiros e 60 vezes maior do que era ha seis anos. E ele dobra de seis
em seis meses (Castells, 2006).
Musica: da cultura de massas a cibercultura
O conceito de industria cultural foi originalmente elaborado por
Adorno e Horkheimer (1970) na decada de 1930, a partir de suas
impressoes das industrias fonograficas e do cinema. Eles vivem na epoca
em que a producao em larga escala, baseada na racionalizacao e na
divisao social do trabalho, promove uma desarticulacao das formas de
vida anteriores. A industrializacao se introduz tambem nas artes e na
cultura, especialmente com a invencao do fonografo e das maquinas do
cinema.
Adorno (1999) se interessou pela passagem da audicao de uma
execucao musical por artistas para a audicao da mesma musica por meio do
fonografo. O uso deste meio mecanico para multiplicar a audicao musical
que lhe sugere a expressao "industria cultural". Esses
filosofos se voltam contra o uso de meios mecanicos de transmissao
musical, pois pensam que a qualidade de composicao e interpretacao deve
ser observada na comunicacao com o publico, e contra a intermediacao
cultural.
A cultura de massas nao pode ser considerada uma arte que nasce de
modo espontaneo, diz Adorno (1999). Na era industrial, "as
massas" nao conhecem nada alem da obrigacao de se distrair e de
relaxar, como parte do necessario processo de recriar a forca de
trabalho esgotada. O modo de producao capitalista determina a
deterioracao da cultura e da arte. A industria cultural subordina os
elementos da cultura, da arte e do divertimento.
A comunicacao, a arte e a cultura sofrem profunda reorganizacao com
o aparecimento das novas tecnologias digitais. As maquinas e os suportes
eletronicos de producao, de armazenamento e de difundir induziram a
profundas transformacoes na forma de produzir e no que se produz. A
musica na era digital vive uma grande reorganizacao das praticas de
criacao e difusao. Ha uma mudanca no uso e na disseminacao da linguagem
musical (Santini, 2005).
A Internet altera o modo de fazer e experimentar a cultura. O
carater hiper-midiatico da web promoveu a "virtualizacao da
musica" de modo muito especial, amparada na sua digitalizacao. Isto
significa dizer que qualquer obra musical e passivel de producao,
compactacao e difusao a maneira de um arquivo de texto ou imagem
digital. A "cibercultura"--isto e, a sinergia entre a esfera
tecnologica das redes de comunicacao e a sociocultural--imprimiu um
redimensionamento ao mundo da musica advindas das tecnicas de compressao
em arquivos de audio (Levy, 1999).
A transmissao de arquivos musicais na Internet muda as relacoes
entre produtores e usuarios de musica. Por um lado, os produtores de
musica podem disseminar com facilidade a sua obra, tornando-a
virtualmente acessivel a milhoes de pessoas sem grandes custos de
distribuicao. Por outro lado, os usuarios podem recuperar e usar
arquivos musicais sem depender da mediacao da industria fonografica. A
possibilidade de que a musica circule sem um suporte fisico faz com que
produtores e usuarios dependam menos da intermediacao da industria
fonografica. As maquinas e seus mecanismos de busca ampliam as
possibilidades de encontro entre publico, obras e autores (Santini,
2005).
A necessidade de simplificar o uso dos arquivos digitais musicais
recuperados atraves da Internet faz surgir dispositivos para sua
reproducao. A facilidade de recuperar os arquivos da Internet (download)
e produzir unidades personalizadas de armazenamento trouxe importantes
mudancas na relacao dos usuarios com o mundo da musica. A unidade
conceitual do album ou CD com menos de uma hora de musica e substituida
pela possibilidade de arquivar milhares de musicas, escolhidas
aleatoriamente, em um pequeno tocador portatil de MP3. O usuario atual
quer as facilidades proporcionadas pelas novas tecnologias e carregar
todas as cancoes preferidas tornou-se viavel e comodo. Forma-se uma
cultura de uso da musica muito particular na cibercultura.
A recuperacao e o uso das informacoes dos arquivos digitais de
audio estao muito facilitados e isto coloca em questao os modelos de uso
produzidos pela industria fonografica. Ha perplexidade das grandes
gravadoras em relacao ao aumento explosivo da disseminacao de arquivos
de musica, atraves do download e da transmissao de cancoes nas radios
online. As grandes empresas da industria fonografica parecem nao ter
percebido o enorme potencial da Internet na difusao dos bens culturais,
focando apenas os aspectos comerciais negativos (Santini, 2005).
A Internet articula virtualmente uma musicoteca, potencialmente sem
limites. A facilidade de inserir os arquivos, de faze-los circularem, de
compartilha-los e de recupera-los muda os processos de difusao e de uso
da musica. As grandes gravadoras perderam o controle do que pode ser
gravado, distribuido e usado. A historia da circulacao de arquivos
digitais de musica atraves da Internet esta apenas comecando.
Na Internet o papel mediador das grandes gravadoras e posto em
xeque, encurtando o caminho entre o artista e o publico: cada vez mais
artistas produzem sem vinculos com a industria fonografica. O
barateamento e a descentralizacao da producao estudios, editoras,
graficas e distribuidoras menores surgem em grandes quantidades para
atender a demanda dos artistas independentes--possibilitam a musicos e
interpretes maior autonomia para producao e distribuicao de suas obras.
As inovacoes tecnologicas modificam as formas de uso da musica. O
download de cancoes e o compartilhamento de arquivos na Internet se
popularizam, facilitando a escolha dos ouvintes. Aumenta o valor da
experimentacao como uma etapa importante no processo de uso da musica. O
usuario de musica se coloca numa posicao privilegiada com a Internet:
navegando na rede, o usuario pode escolher e experimentar, dentre os
mais variados gostos, as cancoes que quer ouvir, na hora que melhor lhe
convier, dispensando, dentro de alguns limites, a intermediacao da
industria da musica.
As conexoes de alta velocidade (banda larga) estao cada vez mais
acessiveis, abrindo espaco ao trafego limpo e ininterrupto de sons e
imagens. Nao so usuarios, mas tambem produtores independentes estao
otimistas: musicos ignorados pela industria cultural divulgam e
compartilham cancoes na rede. As opcoes de uso crescem a medida que a
quantidade de producoes aumenta significativamente, devido ao
barateamento das novas tecnologias de producao, difusao e uso da musica.
Alem da diversidade e da possibilidade de experimentacao, outro
aspecto que se mostra extremamente relevante no uso da musica atraves da
Internet e o grau potencial de intervencao. Os suportes tradicionais de
informacao--como livro, disco, filmes--oferecem algumas possibilidades
de intervencao: pode-se avancar e retornar sobre um mesmo trecho de um
romance, repetir uma certa cena de um video ou diminuir o volume de um
disco ou um CD. Estas parecem limitadas em termos de intervencao se
comparadas aquelas que se tornam possiveis com a utilizacao do
computador.
A consequencia direta dos conceitos de simulacao e virtualidade em
relacao as informacoes digitais e a possibilidade de intervir tanto no
nivel organizacional como no nivel estrutural das informacoes. Os
computadores oferecem ferramentas que possibilitam ao usuario controle
maior sobre as informacoes disponiveis. Essas ferramentas possuem
recursos de busca, selecao, edicao ou classificacao, que sao inviaveis
em outros meios como livros e discos tradicionais.
O carater potencial dos dados audiveis digitais faz com que o
usuario possa manipula-los, transformalos ou recria-los de maneiras
diversas, alterando assim os proprios signos originalmente codificados.
A intervencao digital modifica a forma de usufruir a cultura: a
experimentacao digital da musica pode resultar na propria transformacao
estetica dos produtos oferecidos na cibercultura.
E cedo para apostar que a Internet libertara os bens culturais de
quaisquer influencias da industria cultural, mas parece adequado esperar
mudanca na correlacao de forcas--dessa vez a favor dos usuarios.
Enquanto a industria da musica--particularmente as grandes gravadoras e
os seus artistas--se debatem na perplexidade de nao saber como agir
diante do MP3 e da cibercultura, artistas e usuarios incluem cada vez
mais as novas tecnologias em suas vidas.
A industria cultural enfrenta grandes desafios na sociedade da
informacao: a protecao do conteudo digital; derrotar a pirataria e
procurar manter lucrativos os seus negocios com a venda de produtos. Os
executivos da industria cultural tem se preocupado mais em criar
mecanismos de protecao contra as copias do que em encontrar alternativas
para venda de seus produtos. Na visao das empresas a pirataria e os
servicos de compartilhamento de conteudos (redes P2P) sao os grandes
culpados pela crise.
As forcas socio-culturais da Internet nao se reduzem as inovacoes
tecnologicas. O uso das maquinas e softwares representa adesao a formas
especificas de compartilhamento de informacao e conhecimento. Os
usuarios de computadores interconectados estabelecem relacoes e criam
comunidades virtuais. Estas relacoes e comunidades moldam o
comportamento e a organizacao social em rede. A cultura comunitaria
virtual acrescenta dimensao social ao compartilhamento de conteudos,
fazendo da Internet um meio de integracao social e simbolica.
Consideracoes finais
A cibercultura emerge em torno das novas tecnologias de informacao
e comunicacao, especialmente da Internet, e inclui compartilhamento de
informacao e formas colaborativas de producao criativa. Destacase o caso
da musica, que esta na vanguarda deste processo de mudanca cultural. As
transformacoes que se presencia em relacao a musica na Internet sao
analogas as transformacoes que se intensificam em relacao a outros
produtos culturais, como o livro e o filme.
A digitalizacao dos conteudos e suportes facilita e potencializa o
compartilhamento de bens simbolicos. Observa-se que a cibercultura cria
forma propria de uso da musica, produzida pela interacao entre
tecnologias digitais e formas solidarias e colaborativas de
sociabilidade. O fenomeno da musica na Internet e complexo e funciona
por adicao e multiplicacao das formas de produzir, compartilhar,
recuperar e usar conteudos culturais na sociedade da informacao. A
industria fonografica decai, investindo nas trilhas sonoras do cinema,
produzindo catalogos de DVDs, comercializando ringtones, etc.
A Internet potencializa abertura e liberacao da producao, que
marcam a cultura da rede: chats, orkut, weblogs, podcast, peer-to-peer
para compartilhamento de musica, imagens, filmes e textos. A industria
cultural esta em grave crise. A cibercultura viabiliza novos processos
colaborativos de producao e compartilhamentos de informacao, mudando as
formacoes socioculturais, politicas e economicas
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NOTAS
(1) P2P designa um modelo de rede de informatica onde os elementos
(ou nos) nao tem um papel exclusivo de cliente ou servidor. Funcionam
das duas maneiras, sendo ora cliente ora servidor dos demais nos dessa
rede, contrariamente aos sistemas do tipo "clienteservidor",
no sentido comum do termo. Disponivel em:
<http://pt.wikipedia.org/wiki/P2P>.
Clovis Ricardo Montenegro de Lima
Professor do Departamento de Ciencia da Informacao da UFSC/SC/BR
clovis.mlima@uol.com.br
Rose Marie Santini
Doutoranda em Ciencia da Informacao pelo IBICT/UFF e em Comunicacao
e Cultura pela UFRJ/RJ/BR
mariesantini@gmail.com
Quadro 1. Comunicacao e cultura musical na Modernidade
e na Sociedade da Informacao
Modernidade Sociedade da Informacao
Tempo do espirito Escrita Informatica
Produto Musica popular, Musica eletronica,
cancoes obra aberta, colagens
Tecnologia Instrumentos Computadores,
eletricos, Softwares, MP3 player
Fonografo
Registro Analogico: Digital:
cilindro, vinil, CD, DVD, MP3
fita magnetica
Meios de difusao Radio e TV Internet,
telefone celular
Comunicacao e Cultura Industria cultural, Cibercultura,
cultura de massa redes colaborativas