Corporate governance practices listed for monitoring: an analysis of the level of adoption in agriculture cooperatives/Practicas de governanca corporativa indicadas para monitoramento: uma analise do nivel de adocao em cooperativas agropecuarias/Practicas de governanza corporativa indicadas para monitorizacion: un analisis del nivel de adopcion en cooperativas agropecuarias.
Siquiera, Luciana Cardoso ; Neto, Sigismundo Bialoskorski
1. INTRODUCAO
Convencionalmente, os proprietarios da firma sao aqueles que
dividem dois direitos formais: o direito formal ao controle da firma, ou
seja, o direito de decisao, e o direito aos residuos, entendendo-se por
residuos os ganhos liquidos (HANSMANN, 1996).
A presente pesquisa foca o direito ao controle da firma em
cooperativas que, sendo organizacoes de propriedade coletiva, apresentam
problemas de custos coletivos para tomadas de decisoes.
Considerando-se que em contextos de propriedade coletiva existem
diferentes interesses particulares, a tomada de decisao pode se tornar
complexa e muitas vezes divergente da funcao objetivo da empresa. Assim,
a propriedade dispersa implica a delegacao do direito de controle e
monitoramento dos diversos proprietarios, o que influencia os padroes de
propriedade e a maneira como tais firmas sao organizadas internamente.
Em contextos de delegacao do direito de controle, diversas decisoes
sao tomadas por gestores nomeados para decidir em nome dos
proprietarios. Assim, faz-se relevante um sistema que governe, coordene
e monitore as acoes dos agentes encarregados da tomada de decisao.
Na literatura dos conflitos de agencia argumenta-se que os gestores
e os que estao dentro da organizacao tem objetivos diferentes daqueles
dos investidores externos e irao agir em seu proprio interesse quando
tiverem oportunidade, usualmente a custa dos investidores externos
(JENSEN; MECKLING, 1976). Essas oportunidades tendem a acontecer nas
empresas com uma estrutura pobre de governanca, caracterizada pela
ausencia de um monitoramento efetivo e de mecanismos de disciplinamento.
Segundo Shleifer e Vishny (1997), aqueles que estao dentro das
organizacoes tem maior tendencia a adotar estrategias subotimas, a
manipular as medidas de performance e a expropriar valor. Como
consequencia, tais firmas exibem performances mais baixas. Para os
autores, ao adotarem boas praticas de governanca, as empresas podem
reduzir custos de agencia e diminuir esse comportamento subotimo, ja que
passam a monitorar com maior intensidade as acoes dos agentes. Os mesmos
autores ainda destacam que isso deveria resultar em melhores
performances.
Observando assim a relevancia de uma estrutura de monitoramento, o
IBGC (2009:19) define Governanca Corporativa como "o sistema pelo
qual as organizacoes sao dirigidas, monitoradas e incentivadas,
envolvendo os relacionamentos entre proprietarios, Conselho de
Administracao, Diretoria e orgaos de controle".
Nesse sentido, o presente trabalho analisa o Conselho Fiscal e a
auditoria como mecanismos de governanca encarregados do monitoramento e
fiscalizacao das cooperativas, tendo como fundamentacao para a analise a
teoria e os principios da chamada boa governanca.
Utilizam-se duas fontes principais para estabelecer o papel do
Conselho Fiscal e da auditoria no contexto da governanca corporativa das
cooperativas: (a) a analise das responsabilidades determinadas na lei e
(b) os codigos de melhores praticas de governanca do Instituto
Brasileiro de Governanca Corporativa (IBGC) e da Organization for
Economic Cooperation and Development (OECD).
Assim, o trabalho pretende contribuir no sentido de responder as
seguintes questoes: quais sao as praticas de monitoramento da gestao
indicadas ao conselho fiscal e auditorias externa e interna pelos
codigos de governanca corporativa e quao proximas as cooperativas
agropecuarias estao do que e indicado por esses codigos?
O objetivo geral do trabalho e verificar as praticas de
monitoramento indicadas ao Conselho Fiscal e as auditorias externa e
interna e analisar sua adocao nas cooperativas agropecuarias.
Para tanto, procura-se alcancar os seguintes objetivos especificos:
(a) comparar as praticas de monitoramento desenvolvidas pelos conselhos
fiscais e auditoria nas cooperativas com as indicadas pelos codigos de
melhores praticas; e (b) analisar o nivel de adocao de boas praticas de
governanca.
Considerando-se que as firmas que apresentam melhores indices de
governanca aumentam a probabilidade de os agentes tomadores de decisoes
investirem em projetos viaveis e, portanto, apresentam melhor
performance operacional (BROWN; CAYLOR, 2004), torna-se relevante a
analise de quao proximas as organizacoes estao do indicado pelos
codigos, para assim compreender o contexto no qual os gestores atuam.
No Brasil, de acordo com a Organizacao das Cooperativas Brasileiras
(OC, 2011), em 2010 existiam 6.652 cooperativas, que tinham
aproximadamente 9 milhoes de associados e geravam diretamente 298.182
mil empregos diretos, numeros que mostram a representatividade do setor
cooperativista no pais.
Apesar da representatividade do setor no pais, cabe ressaltar que
pouco se sabe sobre praticas de governanca das cooperativas que vao alem
daquelas determinadas pela legislacao. Tal assunto tambem e relevante
porque as cooperativas fazem parte de grupos de grandes empresas, ate
mesmo exportadoras, conforme se verifica nos resultados das Melhores e
Maiores (2005, 2006, 2007, 2008, 2009).
Diversos artigos recentes, de acordo com Bhagat e Bolton (2008),
utilizam medidas de governanca corporativa alternativas para a
compreensao do nivel de adocao das melhores praticas. Esses autores
tambem consideram que diferentes medidas podem nao ser apropriadas para
o contexto das diversas formas organizacionais, e que nao e possivel
encontrar um consenso sobre as medidas de governanca.
Nesse sentido, o presente trabalho contribui para a analise
exploratoria do contexto e da dinamica das praticas de monitoramento de
governanca em cooperativas, considerando na fundamentacao teorica e na
metodologia as caracteristicas especificas do objeto de estudo.
2. REFERENCIAL TEORICO
2.1. Especificidades da forma organizacional cooperativa
As cooperativas apresentam algumas caracteristicas que devem ser
destacadas. A primeira refere-se ao fato de suas atividades estarem
ligadas diretamente com a propriedade privada de seus associados, uma
vez que oferecem servicos que vao ao encontro das necessidades das
atividades particulares destes (HELMBERG, 1966). Ainda, seus
proprietarios detem e utilizam coletivamente o patrimonio e os servicos
da cooperativa. Essa dualidade faz com que as decisoes de investimentos
nessas organizacoes sejam tomadas procurando-se atender as necessidades
dos cooperados/proprietarios e da propria empresa, e, portanto, isso
torna mais complexa a definicao de sua funcao objetivo (ENKE, 1945).
Adicionalmente, conforme destacado por Vitaliano (1983), a forma de
controle da cooperativa tambem pode ser diferente, uma vez que esta e
controlada por membros eleitos em assembleia geral (um homem, um voto),
ou seja, alguns proprietarios sao designados pelos demais para compor o
conselho de administracao.
Ainda, a forma de retorno aos proprietarios tambem difere. De
acordo com Rhodes (1983), os retornos aos cooperados acontecem de forma
proporcional ao volume de negociacao que este manteve junto a
cooperativa e nao com base na cota de capital integralizada.
A forma da distribuicao da propriedade e controle tambem difere.
Segundo Bialoskorski Neto (2008:17): "Como nao ha uma separacao
entre propriedade e controle nos empreendimentos cooperativos, e o
associado e ao mesmo tempo usuario e proprietario de seu negocio, a
cooperativa pode ser conduzida a uma situacao de ineficiencia."
Assim, ao se discutir a separacao entre propriedade e gestao, deve-se
levar em conta o fato de que decisoes estrategicas das cooperativas
podem ser influenciadas por necessidades particulares dos associados, e
que a influencia nas decisoes economicas pode acontecer tanto pelo voto
dos cooperados na assembleia quanto pelas decisoes tomadas no conselho
de administracao, uma vez que os conselhos sao formados por associados.
De acordo com o mesmo autor, a subscricao de quotas-parte e, assim,
a participacao do associado na cooperativa dao a este o direito ao uso
dos servicos prestados pela organizacao. Essa caracteristica particular
das cooperativas estabelece, alem da relacao de propriedade, tambem a
relacao de clientes e fornecedores com a cooperativa, ou seja, o mesmo
agente economico desempenha papeis diferentes na organizacao.
Para Colin (2007), pouca atencao tem sido dada a governanca
corporativa de empresas familiares, empresas controladas pelo Estado,
grupos de empresas, dentre outros, como as cooperativas. Para o mesmo
autor, nestas organizacoes os proprietarios ou os principais tem mais
poder e exercem maior impacto na organizacao.
Observa-se assim, que as cooperativas, apesar de tambem serem
constituidas como organizacoes de propriedade dispersa, atuam com
finalidades diferentes das companhias abertas, alem de apresentarem
caracteristicas especificas. P articularidades de sua estrutura de
propriedade refletem em sua estrutura de governanca--dentre elas o fato
de os conselhos serem formados por associados, enquanto a literatura de
governanca indica como ideal a independencia dos conselheiros (COLIN,
2007).
Outro ponto a ser considerado e que parte da estrutura de
governanca das cooperativas e originada de uma determinacao legal, ou
seja, a presenca de conselhos de administracao e fiscal e uma imposicao
e nao uma opcao de adocao.
As observacoes acima permitem considerar que o monitoramento e a
fiscalizacao das cooperativas a partir de um sistema de governanca
corporativa nao sao relevantes a ponto de impactar seja a eficiencia
interna da organizacao, seja a riqueza particular dos associados.
Considerando a nocao de firma como um conjunto de contratos e que
tais contratos apresentam limitacoes para sua execucao (COASE, 1937), o
proximo item explora as bases teoricas que fundamentam a relevancia da
governanca corporativa na conducao dos contratos estabelecidos entre os
fatores de producao.
2.2. Contratos incompletos, pressupostos comportamentais e
governanca
De acordo com Fama (1980), a firma e disciplinada pela competicao
com outras firmas, o que forca a evolucao de ferramentas eficientes para
o monitoramento da performance do time como um todo e de seus membros
individualmente. O mesmo autor expoe que, nesse contexto, a firma e
apenas um conjunto de contratos que cobrem a maneira pela qual os
recursos sao reunidos para criar resultados e as receitas desses outpus
sao distribuidas entre esses recursos.
Nesse sentido, Hart e Moore (1998) destacam que os proprietarios
detem, alem do direito ao residuo, o direito de tomar todas as decisoes
sobre os ativos da firma que nao foram especificadas ex ante no contrato
em razao da impossibilidade de completude deste, devida aos custos de
transacao. Para os autores, nesse contexto, a alocacao da autoridade
passa a ser um assunto relevante.
Considerando-se que os contratos sao incompletos, ou seja, nem
todas as contingencias podem ser especificadas ex ante, tem-se assim a
necessidade de tomar decisoes num momento ex post ao estabelecimento do
contrato. Para tanto, e para coordenar e monitorar a execucao desses
contratos, sao necessarias estruturas de governanca, dado que alguns
agentes economicos terao poder discricionario sobre a utilizacao e
destinacao dos ativos e, com isso, poderao decidir por acoes que
diminuam o valor da firma.
No contexto de contratos incompletos e governanca dos contratos, e
necessario considerar alguns pressupostos comportamentais dos agentes
economicos, dentre os quais a racionalidade limitada, ou seja, a
impossibilidade de os agentes economicos preverem todas as contingencias
contratuais futuras (SELTEN, 2001). Em razao dessa racionalidade
limitada e do comportamentos oportunista, ocorrem quebras contratuais
onerosas, que acontecem pela recusa em cooperar, por ma adaptacao das
partes durante a execucao do contrato ou mesmo pela possibilidade de
renegociacao contratual, o que gera demanda por esforcos privados de
ordenacao, ou seja, a necessidade de estruturas de governanca que
oferecam apoio e contribuam para mitigar possiveis impasses ou ate mesmo
rompimentos contratuais (WILLIAMSON, 2002).
Tambem pode haver ineficiencias ex post ao contrato, caso da
assimetria de informacao. Conforme destacado por Hart e Moore (1998), a
fonte de ineficiencias ex post e o fato de que aqueles agentes
participantes do contrato (insiders) tem informacoes privadas sobre suas
preferencias individuais. A assimetria informacional tambem advem do
fato de certas afirmacoes contingenciais serem inviaveis na redacao do
contrato porque o mundo real nao e observado da mesma maneira por todas
as partes do contrato (HART; MOORE 1988).
Rajan e Zingales (2000) consideram que, sob uma perspectiva
tradicional, o principal objetivo da governanca corporativa e a
maximizacao do valor ao proprietario. Assim, a maneira pela qual e
distribuido o direito ao controle e a decisao sobre os ativos, ou seja,
a forma pela qual o ativo deve ser governado deve corresponder a uma
estrutura de governanca que possibilite limitar e coordenar o poder de
controle delegado aos agentes, a fim de evitar decisoes que expropriem o
valor originalmente investido na empresa.
Considerando-se que a governanca corporativa diz respeito a
resolucao de problemas de (a) acoes coletivas entre investidores
dispersos, (b) a conciliacao de conflitos de interesse entre outros
agentes contratuais, e (c) ao regramento da governanca corporativa, que
e o resultado dos contratos entre investidores, gestores e demais
agentes contratuais e tem a finalidade de atingir a eficiencia do
arranjo contratual (BECHT; BOLTON; ROELL, 2005), tem-se entao que a
adocao das boas praticas de governanca indicadas pelos codigos de
governanca corporativa conduz a reducao de acoes oportunistas dos
membros participantes do time, uma vez que, pela adocao dessas praticas,
espera-se exercer o monitoramento necessario em um dado arranjo
contratual.
Num contexto de propriedade dispersa, no qual varios agentes
contratuais possuem direito residual ao controle, muitos problemas de
governanca advem do fato de os diversos proprietarios desejarem exercer
o controle, de maneira diferente (BECHT et al., 2005). Assim, torna-se
inviavel a tomada de decisoes de maneira coletiva, e parte do poder de
decisao e controle sobre os ativos da organizacao e delegado a gestores,
originando-se assim um contexto de separacao entre propriedade e gestao.
Nesse sentido, a governanca corporativa trata, em parte, de
praticas de monitoramento do poder de decisao delegado aos gestores. A
maneira pela qual os contratos sao organizados determina a forma
organizacional da firma. Ainda, a forma com que as organizacoes alocam
os passos do processo de decisao entre os agentes e fator importante que
explica a sobrevivencia das organizacoes (FAMA; JENSEN, 1983). Dentre
esses passos inclui-se o monitoramento, que, nos casos de estruturas de
propriedade dispersa, e delegado, por ser inviavel (custoso e
ineficiente) que cada um dos proprietarios exerca seu direito.
Tratando-se de cooperativas, os proprietarios transferem o direito
do controle formal da decisao ao conselho de administracao eleito em
assembleia geral, o qual, por sua vez, pode delegar as decisoes de
gestao aos executivos da organizacao (COSTA, 2010). A separacao entre
propriedade e gestao origina problemas de agencia, em razao da diferenca
de interesses entre as partes do contrato: no caso, o gestor, denominado
agente na literatura da teoria da agencia, e os proprietarios,
denominados principais. Assim, o fato de os contratos nao serem escritos
e executados sem custos da origem a custos de agencia, como os custos de
monitorar, estruturar e reunir contratos que envolvem agentes com
diferentes interesses (FAMA; JENSEN, 1983).
Para Shleifer e Vishny (1997), a governanca corporativa lida com a
maneira pela qual os investidores se asseguram de ter retorno de seus
investimentos. Para Becht et al. (2005), a governanca corporativa
envolve o problema entre principal e agente e tambem as normas de
governanca resultantes do contrato entre proprietarios e gestao; assim,
o assunto central que envolve a governanca corporativa e o entendimento
dos resultados do processo contratual e de quanto a governanca se
desvia, na pratica, de uma situacao contratual considerada eficiente.
Assim, o sistema de governanca atua no sentido de minimizar os custos de
agencia, ou seja, procura minimizar as chances de expropriacao da
riqueza do principal, acompanhando de forma ordenada e sistematica a
execucao dos contratos entre agentes e principais.
Conforme destacado por Bialoskorski Neto (2008), no contexto das
organizacoes cooperativas, a relacao entre agente e principal pode ser
analisada sob diferentes perspectivas, uma das quais a tomada de decisao
estrategica, na qual os cooperados que delegaram o poder de controle sao
os principais, e o conselho eleito e o agente que deve ser monitorado.
O Conselho de Administracao eleito em Assembleia Geral, por sua
vez, pode delegar as decisoes de gestao aos executivos da organizacao
(COSTA, 2010). Tal situacao corresponde a hipotese de separacao entre os
agentes tomadores de risco e os responsaveis pela gestao.
O controle de interesses divergentes no processo decisorio faz-se
importante quando os gestores da decisao, aqueles que iniciam e
implementam as decisoes, nao sofrem grande parte dos efeitos de suas
decisoes (FAMA; JENSEN, 1983).
Nos contextos em que se verifica a assimetria de informacao no
processo decisorio das organizacoes, tem-se ainda a necessidade de
monitoramento da gestao por parte dos proprietarios. Conforme destacado
por
Anuchitworawong (2010), sob uma perspectiva teorica, mecanismos de
monitoramento sao fatores importantes que ajudam a diminuir a
preocupacao dos investidores com a expropriacao. Para o autor, um grande
numero de mecanismos foi desenvolvido com o proposito de reforcar o
papel de monitoramento dos investidores. Dentre os mecanismos de
governanca voltados ao monitoramento estao as auditorias interna e
externa e tambem o conselho fiscal.
2.3. A governanca corporativa e cooperativa
Bohren e ODEGAARD(2004) consideram que mecanismos de governanca
corporativa sao veiculos para reduzir custos de agencia, i. e.,
ferramentas para minimizar a destruicao de valor de mercado causada por
conflitos de interesses entre os stakeholders da firma. Para Shleifer e
Vishny (1997), mecanismos de governanca corporativa sao instituicoes
economicas ou legais que podem ser alteradas mediante um processo
politico.
Bhagat e Bolton (2008) destacam que, com os indices de governanca
utilizados em sua pesquisa, puderam concluir que melhores indices de
governanca sao correlacionados com melhores performances operacionais
contemporaneas e subsequentes. Para Bocean e Barbu (2007), a governanca
corporativa e um passo importante para construir confianca no mercado e
encorajar investimentos estaveis e de longo prazo. Assim, faz-se
relevante a analise do contexto no qual a tomada de decisao e realizada.
Especificamente para as cooperativas, a lei 5764/71 (BRASIL, 1971)
determina alguns padroes dos mecanismos de governanca. A Assembleia
Geral e definida legalmente como o mecanismo de governanca que tem
"[...] poderes para decidir os negocios relativos ao objeto da
sociedade [...]" (BRASIL, 1971--Capitulo IX, Secao I, art. 38). A
mesma lei, no artigo 47, preve que faca parte da estrutura de governanca
das cooperativas uma diretoria ou conselho de administracao, formados
por associados, que sera responsavel pela administracao da organizacao,
ou seja, sera responsavel por tomar decisoes em nome dos demais
associados, alem de decidir se delega ou nao parte do poder de decisao a
gestores. No que se refere a fiscalizacao e monitoramento da
cooperativa, artigo 56 da referida lei, observa-se que a organizacao
sera fiscalizada por um conselho fiscal, composto de seis associados,
tres dos quais conselheiros efetivos e tres suplentes, eleitos em
assembleia geral.
Observa-se, assim, que a estrutura de governanca corporativa das
cooperativas e, em grande parte, determinada por uma imposicao legal.
Dentre as imposicoes legais relativas a estrutura de governanca
corporativa das cooperativas, destacam-se: (i) a adocao dos mecanismos
de governanca denominados assembleia e conselhos de administracao e
fiscais, (ii) a obrigatoriedade de os conselheiros serem associados a
cooperativa e (iii) a funcao atribuida aos conselheiros fiscais de
proceder ao parecer nos relatorios financeiros.
Para Fama (1980), o conselho e visto como instituicao induzida pelo
mercado, o ultimo a monitorar o conjunto de contratos chamado firma,
aquele que tem como papel mais importante investigar os tomadores de
decisoes que ocupam os cargos mais altos. Para o mesmo autor, num
ambiente competitivo, tende a sobreviver um conjunto de mecanismos de
monitoramento de baixo custo. Nesse sentido, o papel do conselho nessa
estrutura conceitual e prover um mecanismo de monitoramento a custos
relativamente baixos para repor e reorganizar gestores que ocupam cargos
mais altos.
O conselho entao e considerado um mecanismo de governanca que
procura assegurar os interesses dos cooperados; teria, assim, o papel de
garantir a conformidade das operacoes da firma com os objetivos dela.
Segundo Cornforth (2004), nas cooperativas o conselho e o instrumento
mais importante que os associados tem para controlar o comportamento
gerencial.
Conforme destacado por Costa (2010), nas organizacoes cooperativas
cabe ao conselho de administracao o direito de controle formal da
decisao ou de delegar a gestao da decisao a executivos. Segundo o mesmo
autor, a legislacao nao permite que esse conselho vote projetos de cuja
execucao participou, e ainda determina a criacao de outro mecanismo de
governanca, denominado conselho fiscal, que tem o papel de monitorar a
gestao. Assim, nas cooperativas, as funcoes de controle da decisao e
monitoramento inerentes ao conselho sao divididas entre dois mecanismos
de governanca, o conselho de administracao e o fiscal.
T ambem faz parte do monitoramento das cooperativas as auditorias
externa e interna. Sob uma perspectiva contratual, Watts e Zimmerman
(1983) argumentam que a auditoria da gestao por uma parte independente
reduz os problemas de incentivos, ou seja, problemas de agencia,
originados do fato de os gestores da firma (os agentes) nao serem os
detentores dos direitos residuais da firma.
Para Imhoff JR (2003), a contabilidade, a auditoria e tambem a
estrutura de governanca sao componentes no fluxo de informacao para
participantes do mercado. Segundo o autor, a separacao entre propriedade
e gestao originou a possibilidade de comportamentos oportunistas e, em
contrapartida, criou o mercado para auditores independentes, que, ate
entao, eram contratados voluntariamente por alguns a fim de prover uma
maneira de checar a performance da gestao.
Conforme destacado por Al-Ajmi (2009), os servicos de auditoria
desempenham importante papel na reducao da assimetria de informacao,
alem de mitigarem problemas de agencia entre gestores e acionistas, bem
como entre acionistas e credores. De acordo com Joshi, Al-Ajmi e Bremser
(2009), com o aumento e complexidade das organizacoes, auditores
externos sao vistos como mecanismos para prover maior garantia as
informacoes prestadas para a tomada de decisao, reduzir a possibilidade
de erros inocentes e considerar inexatidoes como fraude e manipulacao.
Para Cohen, Krishna Moorthy e Wright (2002), ao atestarem os
relatorios contabeis, os auditores sao parte significante do sistema de
monitoramento da organizacao e, assim, tambem sao considerados um
componente essencial do mosaico da governanca corporativa, uma vez que
monitoram a qualidade do processo de divulgacao de informacoes
financeiras.
Adams (1994) destaca que a auditoria interna, alem de outros
mecanismos de intervencao, como divulgacao de informacoes financeiras e
auditoria externa, ajuda a manter a execucao dos contratos entre
proprietarios (principal) e gestores (agente) a um custo eficiente.
O mesmo autor argumenta que a auditoria interna contribui para a
execucao dos contratos entre principal e agente, bem como para superar
problemas de assimetria informacional; assim, possibilita o
monitoramento das atividades dos agentes de maneira eficiente e com
custos viaveis, considerando ainda as diferencas de natureza e
complexidade das organizacoes, ja que as caracteristicas do negocio
podem tambem influenciar a relacao entre agente e principal.
2.4. Tomada de decisao no contexto da governanca corporativa
Para Miles et al. (1978), as organizacoes constantemente avaliam,
refinam e modificam os mecanismos a fim de atingir seus propositos,
rearranjando suas estruturas, seus papeis, as relacoes entre os
mecanismos, bem como o processo gerencial. Ainda, para a maioria das
organizacoes, o processo dinamico de se ajustar as mudancas e incertezas
do ambiente e enormemente complexo, abrangendo inumeras decisoes e
comportamentos em diversos niveis organizacionais.
Para os autores, tal complexidade do ajuste dos processos pode ser
moldada a medida que se procura estabelecer padroes para o comportamento
organizacional. Considerando-se que os mecanismos de governanca
corporativa sao ferramentas para minimizar a destruicao de valor de
mercado causada por conflitos de interesses entre os stakeholders da
firma (BOHREN; ODEGAARD, 2004), e que, em contextos de delegacao do
direito a tomada de decisao (ou de parte deste direito), as decisoes sao
tomadas por agentes diferentes daqueles que sao detentores dos direitos
residuais (FAMA; JENSEN, 1983), tomase relevante a analise das relacoes
e das praticas que regem as acoes dos agentes que atuam nos mecanismos
de governanca.
Tratando-se especificamente dos conselhos, por exemplo, Carpenter e
Westphal (2001) destacam que o contexto em que os conselhos estao
inseridos, incluindo suas ligacoes com outros conselhos e com a gestao,
prove experiencia estrategica e acesso a informacoes estrategicas,
usadas para monitorar as decisoes, sendo assim relevante a analise das
relacoes existentes entre os varios mecanismos de governanca
corporativa.
Para Fama e Jensen (1983), o processo decisorio de uma organizacao
consiste em duas instancias: (a) a gestao da decisao, composta de
atividades de iniciacao e implementacao, e (b) o controle da decisao,
instancia na qual os agentes sao responsaveis pela ratificacao e
monitoramento das decisoes.
No proximo item analisa-se o sistema de governanca corporativa em
que acontecem as tomadas de decisoes em cooperativas.
2.5. O sistema de governanca segundo o IBGC, a OECD e a lei 5764/71
Para a Organization for Economic Cooperation and Development (OECD,
2004), o mix desejavel de legislacao, regulamentacao, autorregulacao,
normas voluntarias, etc. na area de governanca corporativa varia de pais
para pais. Assim, a presenca de um sistema de governanca corporativa
eficaz tanto numa empresa como na economia como um todo ajuda a prover
um grau de confianca que e necessario para o funcionamento da economia
de mercado. Para a mesma organizacao, a estrutura conceitual de
governanca corporativa tambem depende do ambiente legal, regulatorio e
institucional.
De acordo com Wymeersch (2005), os codigos de governanca sao
colocados em pratica em conjunto com o ambiente legal. O autor acredita
que a interacao entre codigos e legislacao pode ser um assunto complexo,
em razao das diferencas no sistema legal do Estado e tambem na adocao
dos codigos de governanca pela legislacao. Nesse sentido, os codigos
podem ter diferentes niveis de adocao em diferentes ambientes
institucionais. Exemplificando, a implementacao pode ser voluntaria,
considerando as necessidades infundidas pelo mercado; pode tambem ser
uma obrigatoriedade contratual (caso da exigencia de adocao de praticas
de governanca por diversas bolsas de valores); ainda, a obrigatoriedade
pode ter o suporte de autoridades publicas por meio da promulgacao de
leis e normas.
Nesse sentido, algumas explicitacoes legais sao necessarias para a
analise do contexto de governanca das cooperativas. De acordo com a Lei
5.764/71 (BRASIL, 1971), artigos 47 e 48, a sociedade deve ser
administrada por uma diretoria ou conselho de administracao, responsavel
pela contratacao de gerentes, pela determinacao de suas funcoes e
salarios e por governar os contratos estabelecidos com seus gestores.
O artigo 56 da referida lei determina que a organizacao deve ser
fiscalizada assidua e minuciosamente por um conselho fiscal. Tem-se
entao que este orgao participa do monitoramento, uma vez que e
responsavel por verificar e validar os relatorios a serem apresentados a
assembleia. O IBGC (2009) considera o conselho fiscal como parte
integrante do sistema de governanca das organizacoes brasileiras e que
pode ter uma atuacao permanente ou nao, dependendo do estatuto da
organizacao. Para as cooperativas, a adocao do conselho fiscal no
sistema de governanca nao e uma opcao, ja que a Lei 5.764/71 (BRASIL,
1971) determina a presenca desse mecanismo nessas organizacoes.
Para o IBGC (2009:62), os principais objetivos dos conselhos
fiscais sao (i) "fiscalizar os atos dos administradores e verificar
o cumprimento dos seus deveres legais e estatutarios"; (ii)
"opinar sobre o relatorio anual da Administracao, fazendo constar
do seu parecer as informacoes complementares que julgar necessarias ou
uteis a deliberacao da Assembleia Geral; (iii) "opinar sobre as
propostas dos orgaos da Administracao, a serem submetidas a Assembleia
Geral", relativas a modificacao do capital social, emissao de
debentures ou bonus de subscricao, planos de investimento ou orcamentos
de capital, distribuicao de dividendos, transformacao, incorporacao,
fusao ou cisao"; (iv) "denunciar aos orgaos de administracao
erros, fraudes ou crimes que descobrir e, nos casos destes nao tomarem
as providencias necessarias para a protecao dos interesses da companhia,
levar a denuncia para a Assembleia Geral"; (v) "analisar, ao
menos trimestralmente, o balancete e demais demonstracoes financeiras
elaboradas periodicamente pela companhia" e (vi) "examinar as
demonstracoes financeiras do exercicio social e sobre elas opinar".
No que se refere a auditoria externa (independente), o IBGC
(2009:59) indica que todas as organizacoes, incluidas as cooperativas,
"devem ter suas demonstracoes financeiras auditadas por auditor
externo independente". O instituto destaca que este mecanismo de
monitoramento tem como atribuicao principal verificar se as
demonstracoes financeiras condizem com a realidade da sociedade.
Alem da auditoria contabil-financeira, e indicada a revisao e a
avaliacao dos controles internos da organizacao. Deste trabalho dos
auditores deve resultar um relatorio de recomendacoes sobre melhoria e
aperfeicoamento dos controles internos (IBGC, 2009).
Para a OECD (2004), a auditoria independente deve ser realizada
anualmente, a fim de prover garantia externa e objetiva ao conselho e
shareholders de que as demonstracoes financeiras representam de maneira
justa a posicao financeira e a performance da empresa em todos os
aspectos materiais.
Conforme argumentado, a auditoria interna tambem faz parte das
funcoes de monitoramento das organizacoes. De acordo com o IBGC
(2009:47), "a auditoria interna tem a responsabilidade de monitorar
e avaliar a adequacao do ambiente de controles internos e das normas e
procedimentos estabelecidos pela gestao". O instituto considera
tambem que este orgao deve recomendar melhorias para os controles
internos, normas e procedimentos da firma, e que, caso as funcoes de
auditoria interna sejam terceirizadas, o trabalho nao seja feito pela
mesma empresa que desempenha os servicos de auditoria.
Nesse sentido, observa-se que algumas das caracteristicas internas
e externas da governanca corporativa das cooperativas sao similares,
dada a obrigatoriedade legal. Entretanto, as praticas determinadas pelos
codigos de governanca dessas organizacoes tem um carater voluntario de
adocao, podendo assim variar em grandes proporcoes entre as cooperativas
e influenciar as acoes e decisoes dos gestores. Conforme Wymeersch
(2005), num contexto em que nao ha a obrigatoriedade de adocao dos
codigos de governanca corporativa, a decisao de aplicacao destes fica a
cargo dos orgaos corporativos como conselhos e gestao, mas tambem e
possivel que essa adocao ocorra em consequencia de adequacoes percebidas
como positivas pelo mercado em que a organizacao atua.
De acordo com o IBGC (2009), o codigo de melhores praticas de
governanca corporativa e aplicavel a qualquer tipo de organizacao,
independentemente de seu porte, natureza juridica ou tipo de controle.
Para tanto, o instituto indica que cada organizacao avalie quais
praticas devem adotar e a melhor forma de adapta-las as suas estruturas
e realidades.
Wymeersch (2005) destaca que os codigos de governanca, em sua
maioria, sao desenvolvidos sob uma perspectiva denominada comply or
explain, que utiliza a ideia de adocao voluntaria de praticas para
demonstrar ao mercado que a organizacao possui arranjos de governanca
satisfatorios e tambem que divulga informacoes suficientes, a ponto de
criar confianca entre os participantes do mercado.
Tendo como base o arranjo do sistema de governanca proposto pelo
IBGC (2009) e considerando tambem as imposicoes legais ao sistema de
governanca das cooperativas, a figura abaixo mostra os orgaos constantes
no sistema dessas organizacoes, bem como a relacao entre eles.
[FIGURE 1 OMITTED]
As cooperativas sao organizacoes de propriedade coletiva e que
apresentam separacao entre propriedade e gestao, conforme argumentado
nos itens anteriores. Tais caracteristicas influenciam o processo
decisorio e a relacao entre os orgaos de governanca.
A assembleia geral e o orgao pelo qual os associados aprovam (ou
nao) em ultima instancia os resultados e as decisoes tomadas pelo
conselho de administracao. Conforme destacado pelo IBGC (2009), o
conselho de administracao e o orgao responsavel por conduzir os assuntos
estrategicos da organizacao. Paralelamente ao conselho de administracao,
tem-se o conselho fiscal, orgao encarregado de monitorar e fiscalizar as
atividades da gestao. Tal orgao de governanca tem dois mecanismos de
apoio a funcao de monitoramento--as auditorias interna e externa.
Nas cooperativas, parte do conselho de administracao eleito em
assembleia geral desempenha o papel de diretores-conselheiros, ou seja,
sao cooperados e atuam mais proximos das rotinas de gestao. Por sua vez,
os diretores conselheiros coordenam os diretores-executivos, que sao
contratados e atuam na gestao das organizacoes cooperativas, ou seja,
sao aqueles aos quais o conselho de administracao pode delegar parte do
poder decisorio.
3. METODOLOGIA
Para Hair et al. (2005:83), os planos de pesquisa podem ser
agrupados em tres categorias: exploratorio, descritivo ou causal.
Destacam-se aqui duas dessas categorias: a exploratoria e a descritiva.
Um estudo e classificado como exploratorio "quando nao se tem
informacao sobre determinado tema e se deseja conhecer o fenomeno"
(RICHARDSON et al., 2010:66). Concordando com essa ideia, Hair et al.
(2005:83) argumentam que as pesquisas exploratorias sao orientadas para
a descoberta, nao apresentando assim "a intencao de testar
hipoteses especificas de pesquisa". Ja os estudos descritivos visam
descrever alguma situacao e a estatistica descritiva pode ser utilizada
para fins de mensuracao de um evento ou atividade (HAIR JR et al.,
2005:83).
Considerando as classificacoes dadas por esses autores, o presente
estudo e uma pesquisa exploratoria e descritiva, uma vez que se deseja
conhecer a estrutura de governanca corporativa voltada ao monitoramento
das cooperativas agropecuarias, bem como verificar e analisar as
praticas de monitoramento presentes no conselho fiscal, na auditoria
externa e na auditoria interna. Conforme mencionado anteriormente, pouco
se sabe sobre a adocao de praticas de governanca que vao alem das
exigencias legais, o que torna o plano de pesquisa adequado para a
compreensao do contexto em cooperativas agropecuarias.
Dada a delimitacao do tema de pesquisa, nao foi possivel obter
dados de fontes secundarias, razao pela qual foram utilizados metodos
que possibilitassem a formacao do banco de dados.
No que se refere as tecnicas de pesquisa para conduzir estudos
empiricos, uma delas e o survey ou levantamento de dados. Neste metodo
de pesquisa, "o objetivo do estudo determina as perguntas concretas
a serem apresentadas, alem de existir uma relacao reciproca entre
conceitos e itens. Dependendo dos conceitos a serem pesquisados, o
conteudo das perguntas ou itens varia" (GUNTHER, 2003:3). Nesse
sentido, o questionario e o instrumento utilizado neste metodo.
Considerando-se que dentre os objetivos do presente trabalho estao
(a) comparar as praticas de monitoramento desenvolvidas pelos conselhos
fiscais e pela auditoria nas cooperativas com as indicadas pelos codigos
de melhores praticas e (b) analisar o nivel de adocao de boas praticas
de governanca, um questionario foi desenvolvido utilizando-se as
melhores praticas de governanca corporativa constantes nos codigos de
melhores praticas de governanca do IBGC e da OECD, que foram
transformadas em perguntas para a verificacao da presenca de tais
praticas nas cooperativas. Optou-se pela utilizacao do metodo survey,
pelo fato de o questionario possibilitar tal verificacao em um maior
numero de cooperativas, ampliando a base de analise e comparacao.
Para a elaboracao do questionario foram utilizadas as praticas de
governanca indicadas a cada uma das estruturas de monitoramento em
estudo. Assim, a dinamica para a elaboracao das perguntas foi a
seguinte: (i) analise das praticas do Conselho Fiscal e das Auditorias
Externa e Interna constantes nos codigos; (ii) verificacao da possivel
existencia de praticas ja determinadas pela legislacao cooperativa;
(iii) conversao das praticas em perguntas. A fundamentacao para as
perguntas podem ser encontradas em Siqueira (2011).
Para Richardson et al. (2010:161), as amostras nao probabilisticas
sao aquelas em que os sujeitos sao escolhidos por determinados
criterios. Segundo esses autores, neste grupo tem-se as amostras
intencionais ou de selecao racional, cujos "elementos que formam a
amostra relacionam-se intencionalmente de acordo com certas
caracteristicas estabelecidas no plano e nas hipoteses formuladas pelo
pesquisador". A amostra da pesquisa e determinada de forma
intencional, conforme detalhamento a seguir.
Para a aplicacao do questionario, utilizou-se o mesmo banco de
dados de Costa (2010). Fazem parte deste banco de dados cooperativas
agropecuarias cadastradas na Organizacao das Cooperativas Brasileiras
(OCB) que, separadas por unidade federativa, formaram a amostra para
envio dos questionarios as cooperativas dos Estados de Sao Paulo e Minas
Gerais. A amostra para a qual foram enviados os questionarios representa
em torno de 25% da populacao da regiao em estudo.
A regiao estudada e relevante, uma vez que, de acordo com a OCB
(2011), na Regiao Sudeste esta concentrado o maior numero de
cooperativas agropecuarias, especialmente em Sao Paulo e Minas Gerais,
os Estados mais representativos os dois Estados em conjunto representam
aproximadamente % das cooperativas agropecuarias do pais. Das
cooperativas contatadas obtiveram-se 27 respostas.
Os seguintes passos foram seguidos para a aplicacao do
questionario: (i) um primeiro contato por telefone, para que, ao expor
os objetivos da pesquisa, o telefonema fosse encaminhado a pessoa que
pudesse fornecer informacoes sobre conselhos e auditorias; (ii) num
segundo momento, foram explicadas as motivacoes da pesquisa, bem como a
dinamica do questionario (tempo de resposta e tipo de informacoes
questionadas); (iii) em seguida, foi perguntado ao respondente se o
questionario poderia ser aplicado via telefone ou e-mail. Pelo fato de
as informacoes necessarias para a resposta do questionario terem sido
expostas inicialmente, foi possivel obter melhor direcionamento do
questionario ao respondente adequado, e os dados foram coletados na
secretaria dos conselhos ou com os conselheiros.
4. ANALISES E RESULTADOS
Para a analise, as questoes foram primeiramente separadas entre
aquelas que tem por finalidade verificar a presenca da pratica de
monitoramento e aquelas que verificam a frequencia do monitoramento. Num
segundo momento, as perguntas que verificam a presenca das praticas
foram agrupadas por orgao de monitoramento, ou seja, as praticas
verificadas foram separadas entre conselho fiscal, auditoria externa e
auditoria interna.
A finalidade da separacao das perguntas por orgao de monitoramento
e verificar o nivel de conformidade das praticas em cada um dos orgaos
de monitoramento, ou seja, quantas das praticas indicadas a cada
estrutura de governanca sao adotadas. T al verificacao tem relacao com o
principio da responsabilidade corporativa (compliance), que se refere a
postura dos agentes em relacao a definicao dos negocios e operacoes da
organizacao que zelam por sua sustentabilidade e longevidade (IBGC,
2009:19).
As perguntas relativas a frequencia das praticas ou frequencia do
monitoramento sao analisadas conjuntamente com as praticas a que se
referem. A tabela abaixo apresenta as perguntas elaboradas no
questionario, bem como o numero e o porcentual de cooperativas que
adotaram as referidas praticas.
Dentre as praticas analisadas, destaca-se a adocao da pratica de
analise do demonstrativo financeiro por parte do conselho fiscal. Para a
OECD (2004), a estrutura conceitual de governanca corporativa tambem
depende do ambiente legal, regulatorio e institucional. Assim, conforme
indicado pela lei 5.764/71 (BRASIL, 1971), no artigo 44, inciso I, que
confere ao conselho fiscal a obrigatoriedade da prestacao de contas dos
orgaos de administracao acompanhada de seu parecer, destaca-se que, das
27 cooperativas que responderam ao questionario, todas declararam que
seus conselhos fiscais se reunem para analisar os demonstrativos
financeiros, ou seja, verifica-se que a pratica de governanca que tem
fundamentacao legal apresenta um nivel de adocao significativamente
maior se comparada as praticas que sao indicacoes e nao obrigacoes
legais.
Na pergunta referente a atuacao preventiva do conselho fiscal no
que diz respeito a opiniao deste orgao na tomada de decisoes e na
aprovacao de estrategias da cooperativa, 11 cooperativas (40,74%)
responderam que seus conselhos opinam na tomada de decisoes de
investimentos e 10 (37,03%) declararam que seus conselhos fiscais opinam
na aprovacao de estrategias da organizacao. Ainda, 16 cooperativas
informaram que seus conselhos fiscais se reunem separadamente para
analisar as acoes do conselho de administracao, atuando assim de maneira
preventiva.
Sobre a auditoria externa, 9 ou 33,33% das cooperativas informaram
que nao adotam tal estrutura de monitoramento, ou seja, nao sao
auditadas por auditores independentes. Pela legislacao cooperativa, a
contratacao da auditoria independente, apesar de constar na lei, pode
ser contra-argumentada. Assim, a auditoria externa passa a ser um
mecanismo de governanca passivel de nao adocao pelas cooperativas,
analisado sob a perspectiva de indicacao pelos codigos de governanca, o
que justificaria um porcentual representativo de nao contratacao de
auditores externos pelas cooperativas analisadas.
Das 18 cooperativas que apresentam auditoria externa, apenas cinco
(27,78%) disseram ter os servicos de auditoria contratados pelo conselho
fiscal ou pelo menos com o aval e participacao deste no processo de
contratacao. Nesse sentido, cabe ressaltar que a lei 5.764/71 (BRASIL,
1971), no artigo 4, inciso I, atribui ao conselho fiscal a
responsabilidade de dar parecer nos relatorios de gestao, balanco
patrimonial e demonstrativos das sobras ou perdas apuradas. No mesmo
artigo, no paragrafo 2, observa-se que, uma vez que a assembleia geral
aprove os relatorios supracitados, os membros dos orgaos de
administracao e fiscalizacao sao desonerados de suas responsabilidades.
Tais orgaos nao serao desonerados da responsabilidade a eles atribuida
nos casos de erro, dolo, fraude, simulacao e infracao da lei ou do
estatuto. Considerando-se o papel da auditoria de verificar tanto se os
demonstrativos financeiros condizem com a realidade da organizacao
quanto o trabalho da administracao, e relevante a atuacao do conselho
fiscal na contratacao da empresa de auditoria, ja que este conselho tem
o papel de fiscalizar e monitorar a gestao das cooperativas.
Treze cooperativas, ou 72,22% delas, que possuem auditoria externa,
informaram que seu conselho fiscal acompanha os trabalhos dos auditores,
e 100% destas informaram que o conselho fiscal utiliza as informacoes
geradas pelos auditores para dar seu parecer nas demonstracoes contabeis
a serem apresentadas a assembleia geral. Considerando-se tal verificacao
e tambem a responsabilidade do conselho fiscal de dar seu parecer nos
demonstrativos contabeis, pode-se inferir que a auditoria externa teria
o papel de prover a garantia aos conselheiros fiscais de que as
demonstracoes financeiras da cooperativa condizem com a realidade,
tornandose assim um mecanismo de apoio as funcoes de monitoramento do
conselho.
Ainda, de acordo com o Codigo do IBGC, "o Comite de Auditoria
deve recomendar ao Conselho de Administracao a contratacao, remuneracao,
retencao e substituicao do auditor independente" (IBGC, 2009:59).
Apesar de o Comite de Auditoria ser um orgao de controle com funcoes
delegadas pelo Conselho de Administracao, parte de suas funcoes pode se
sobrepor a funcao do Conselho Fiscal, conforme destacado pelo mesmo
codigo. Este ultimo, por sua vez, tendo dentre suas funcoes as de
fiscalizar demonstracoes financeiras e emitir parecer sobre tal
demonstracao, tem interesse direto nos trabalhos desempenhados pelos
auditores externos, uma vez que responde juridicamente por quaisquer
eventuais fraudes. Assim, espera-se que, na ausencia do Comite de
Auditoria, o Conselho Fiscal atue na contratacao dos auditores
independentes.
Considerando-se que as cooperativas que contratam auditoria
independente tambem informaram que o conselho utiliza o parecer da
auditoria para proceder ao seu parecer, esperavase que os relatorios da
auditoria fossem apresentados primeiramente ao conselho fiscal.
Diferentemente disso, observou-se que em apenas 2 cooperativas (7,41%)
os relatorios da auditoria sao apresentados primeiramente ao conselho
fiscal.
Nesse sentido, verificou-se que quatro de vinte e sete cooperativas
(14,81%) possuem comite de auditoria. Considerando-se que (1) 85,19% das
cooperativas nao possuem comite de auditoria; (2) que parte das funcoes
do conselho fiscal e do comite de auditoria pode ser sobreposta; e (3)
que os conselheiros fiscais sao responsaveis por dar seu parecer nos
demonstrativos financeiros, destaca-se aqui o fato de que em apenas 18,
52% das cooperativas o conselho fiscal contribui para a contratacao da
auditoria externa.
Conforme destacado anteriormente, o codigo da OECD (2004) recomenda
que uma auditoria independente seja feita anualmente a fim de prover o
conselho e shareholders de uma garantia externa e objetiva de que as
demonstracoes financeiras representam de maneira justa a posicao
financeira e a performance da empresa em todos os aspectos materiais
(OECD, 2004). Uma das variaveis que tem relacao com a independencia da
auditoria e a analise da rotatividade da empresa de auditoria. Conforme
citado anteriormente, verificou-se que 33,33% das cooperativas nao tem
seus demonstrativos auditados. Das demais cooperativas que declararam
ter seus demonstrativos auditados, 33,33% indicaram trocar as empresas
de auditoria a cada dois anos; 22,22% trocam a empresa que presta este
servico a cada tres anos; outros 22,22% o fazem a cada quatro anos e as
demais a cada cinco anos. Nenhuma cooperativa declarou manter a mesma
empresa de auditoria por mais de cinco anos. Verifica-se assim a
conformidade com o Codigo do IBGC (2009) e tambem com a instrucao CVM
308/1999 (CVM, 1999), que indicam a troca da empresa de auditoria pelo
menos a cada cinco anos.
Ainda sobre a auditoria externa, 66,67% das cooperativas tambem
informaram que as possiveis correcoes indicadas pelas empresas de
auditoria sao desenvolvidas pela propria cooperativa ou por empresa
diferente daquela que prestou os servicos de auditoria, sendo
condizentes com a indicacao do codigo de que "o auditor nao pode
auditar seu proprio trabalho" e, assim, "nao deve realizar
trabalhos de consultoria para a organizacao que audita"(IBGC,
2009:60).
Sobre a auditoria interna, apenas 25,93% informaram manter esta
estrutura de monitoramento. Dessas cooperativas que possuem auditoria
interna, quatro delas se reunem com o conselho fiscal e nenhuma delas
contrata servicos de auditoria interna de empresa terceirizada.
Em relacao ao nivel de adocao de praticas dos mecanismos estudados,
considera-se que o conselho fiscal, sendo um mecanismo obrigatorio, tem
um nivel de adocao de maior proporcao, ou seja, apesar de apenas 11,11%
das cooperativas estudadas declararem adotar todas as praticas
referentes ao conselho fiscal, um numero maior de cooperativas (59,26%)
adotam entre 60 e 80% das praticas estudadas. Verifica assim que o
ambiente regulatorio e um instrumento que interfere no nivel de adocao
de praticas de governanca corporativa, que, por sua vez, pode impactar
as decisoes da gestao.
Considerando-se a indicacao legal de que os relatorios financeiros
das cooperativas devem ser auditados, e comparando-se as praticas
estudadas, verifica-se que um numero maior de cooperativas adota aquelas
praticas de monitoramento que estao mais proximas da legislacao.
Verificou-se que 66,67% das cooperativas declararam ter auditoria
externa, ainda que esta seja uma indicacao legal, e este mesmo
porcentual e apresentado para a questao de os conselhos fiscais
utilizarem o parecer da auditoria para proceder ao seu parecer, outra
indicacao.
As praticas verificadas referentes a remuneracao do conselho
fiscal, a rotatividade da auditoria e as melhorias sugeridas pela
auditoria externa para serem executadas por empresa diferentes ou pela
propria cooperativa tambem apresentaram um porcentual de adocao
representativo--66,67%.
Alem da verificacao da presenca das praticas de monitoramento,
parte do questionario procura verificar caracteristicas da estrutura de
governanca como frequencia de reunioes entre os orgaos de monitoramento
e tipos de auditoria contratada (por exemplo, auditoria financeira, de
processos e controles, de gestao, ou outra opcao caso a cooperativa
apresente).
Verificou-se que em 21 cooperativas ou em 77,77%, o conselho fiscal
se reune mensalmente. Nas demais cooperativas os resultados variam
significativamente entre reunioes semanais e apenas duas ao ano.
Conforme destacado pelo Codigo do IBGC, "o Conselho de
Administracao deve reunir-se periodicamente com o Conselho Fiscal"
(IBGC, 2009:50). Verificou-se, pela aplicacao do questionario, que em
59,25% das cooperativas a reuniao entre os dois conselhos acontece uma
vez por mes. As demais frequencias verificadas nao aparecem de maneira
uniforme, e ha casos em que os conselhos nao se reunem.
Analisando-se a convergencia entre a obrigacao legal de os
conselheiros fiscais darem seu parecer nos demonstrativos contabeis e o
principio de governanca de prestacao de contas ou accountability, que se
refere ao fato de os "agentes de governanca deverem prestar contas
de sua atuacao, assumindo integralmente as consequencias de seus atos e
omissoes" (IBGC, 2009:19), observou-se a frequencia com que os
agentes de governanca encarregados do monitoramento desempenham suas
funcoes para, ao final de cada periodo, prestarem contas de sua atuacao.
Verificou-se que 55,55% das cooperativas estao de acordo com a indicacao
do codigo, e em 44,45% a analise dos demonstrativos acontece em
frequencia menor que a indicada pelo menos trimestral.
Conforme verificado anteriormente, dezoito cooperativas declararam
ter auditoria externa. Algumas cooperativas contratam outros servicos de
auditoria alem da auditoria dos demonstrativos financeiros. Verificou-se
que sete cooperativas (38,89%) contratam apenas um tipo de auditoria,
mas que outras sete cooperativas contratam outros tipos de auditoria,
como a auditoria de processos e controle ou auditoria de gestao. Em
quatro cooperativas (22,22,%) foram verificados tres tipos de auditoria
diferentes.
Em relacao a auditoria interna, verificou-se que 74,07% das
cooperativas nao apresentam esta estrutura de monitoramento, e que
apenas 14,81% declararam que a auditoria interna se reune com o conselho
fiscal.
A fim de complementar a analise do nivel de adocao de praticas de
monitoramento, a tabela abaixo demonstra o porcentual de cooperativas
por numero de praticas de governanca verificadas no questionario. As
praticas verificadas no questionario foram tambem distribuidas entre os
orgaos de monitoramento, da seguinte maneira: (a) verificacao de cinco
praticas do conselho fiscal; (b) sete praticas de auditoria externa; e
(c) tres praticas de auditoria interna. Dessa maneira, e possivel
verificar o nivel de boas praticas de governanca para cada estrutura de
monitoramento analisada.
Somando-se o numero de respostas positivas obtidas no questionario,
tem-se que, em relacao ao conselho fiscal, 59,26% das cooperativas
estudadas adotam mais da metade das praticas estudadas. No que se refere
a adocao de praticas de auditoria externa, destaca-se o fato de que
33,33% das cooperativas nao apresentam tal estrutura de governanca, bem
como o fato de apenas uma cooperativa adotar todas as praticas
analisadas. A auditoria interna apresenta um porcentual ainda maior de
nao adocao do mecanismo: 74,07%.
5. CONSIDERACOES FINAIS
Em decorrencia das analises das praticas de monitoramento das
cooperativas agropecuarias pesquisadas, pode-se avaliar seu nivel de
adocao de praticas de monitoramento.
Manteve-se o foco em tres estruturas de governanca voltadas ao
monitoramento da gestao: (a) o conselho fiscal, (b) a auditoria externa
e (c) a auditoria interna. Assim, chegou-se as seguintes conclusoes na
analise de cada uma delas.
Verifica-se que pouco mais de um terco dos conselhos fiscais opinam
anteriormente sobre os investimentos ou estrategias da cooperativa. Tal
verificacao indica que a maioria dos conselhos fiscais monitora e
fiscaliza as acoes num momento posterior a tomada de decisao pelo
conselho de administracao, ao contrario do que e indicado pelos codigos
de governanca corporativa.
Em 59% das cooperativas, o conselho fiscal reune-se para analisar a
atuacao do conselho de administracao, atuando assim conforme ao indicado
como melhores praticas de governanca, ja que o monitoramento da gestao,
bem como de possiveis conflitos entre gestores e conselho de
administracao, deve fazer parte da agenda de trabalho do conselho
fiscal.
Todas as cooperativas declararam que seus conselhos fiscais se
reunem para analisar os demonstrativos financeiros. Assim, comparandose
as praticas que tem obrigatoriedade legal--caso do parecer nos
relatorios financeiros, assim como do monitoramento e da
fiscalizacao--com as praticas que implicam uma acao preventiva,
verificou-se maior adocao de praticas de governanca obrigatorias por lei
do que daquelas que nao sao obrigatorias. Tal constatacao e relevante
uma vez que a relacao entre maior nivel de governanca e melhor
performance e verificada em pesquisas anteriores.
Em relacao a dinamica das reunioes, verificase um contexto em que
os conselhos de administracao e fiscal se reunem em conjunto. Tal fato
dificulta a atuacao do conselho fiscal como orgao fiscalizador, ja que
ele se reune com parte dos agentes economicos que deveriam ser
fiscalizados, o que pode inibir a atuacao dos membros do conselho
fiscal.
Analisa-se tambem a auditoria externa, que e parte significativa no
sistema de monitoramento pois atesta se as informacoes constantes nos
relatorios desenvolvidos pela gestao condizem com a realidade da
organizacao. A adocao deste orgao de governanca no contexto cooperativo
e tratada de forma diferente do conselho fiscal, ja que a lei das
cooperativas nao obriga a contratacao dos servicos de auditoria
independente, indicando-a apenas. Tal situacao justificaria o nivel de
nao adocao deste mecanismo por 1/3 das cooperativas.
Verifica-se que em mais de 80% das cooperativas o conselho fiscal
nao participa da contratacao da auditoria externa, mesmo tendo a
responsabilidade de dar parecer nos demonstrativos financeiros. Ainda se
observa que em 93% das cooperativas os resultados da auditoria nao sao
apresentados primeiramente ao conselho fiscal. Tais constatacoes
implicam a possibilidade de definicao por parte da gestao da cooperativa
e do conselho de administracao sobre a contratacao da firma que devera
atuar na auditoria. Alem disso, conhecendo anteriormente os resultados
da auditoria, as estruturas encarregadas da gestao podem argumentar
previamente sobre o parecer dos auditores. Nesse contexto, o conselho
fiscal utiliza os relatorios posteriormente e, possivelmente, apenas
como uma garantia para seu parecer, nao atuando de maneira preventiva e
independente, uma vez que somente acata ou nao o resultado do parecer
que esteve sujeito a decisoes e argumentacoes anteriores.
Dada tal relacao, verificou-se que o porcentual de cooperativas que
adota auditoria externa, dois tercos, e o mesmo das cooperativas que
declararam que os conselhos utilizam o parecer da auditoria externa para
dar seu parecer, ou seja, existe uma indicacao de que as cooperativas
contratam a auditoria externa com a finalidade principal de prover
garantia para o parecer dos conselheiros na assembleia geral. Destaca-se
ainda que aproximadamente 40% das cooperativas declararam contratar
apenas a auditoria financeira.
A auditoria interna, por sua vez, deve ser o mecanismo de
monitoramento que possibilite acesso a informacoes importantes para a
conducao e gestao dos contratos, alem de ter a responsabilidade de
avaliar a adequacao dos controles internos. Verifica-se que
aproximadamente 75% das cooperativas nao apresentam tal mecanismo.
Verifica-se tambem que apenas 14,81% das cooperativas mantem o canal de
informacoes entre a auditoria interna e o conselho fiscal. A
complementaridade das funcoes desses dois orgaos contribui para
minimizar a assimetria de informacao entre conselho fiscal e gestao,
produzindo assim melhores resultados de monitoramento.
A existencia de um canal de comunicacao entre auditoria interna e
conselho fiscal e indicada pelos codigos de governanca, sendo tambem
adequada pelo fato de possibilitar que os participantes das duas
estruturas de governanca discutam conjuntamente os controles e processos
internos da organizacao, a fim de verificarem a necessidade de mudancas
no sistema de monitoramento.
Comparando-se a aderencia de praticas de governanca entre os
mecanismos estudados, verificou-se que, para o conselho fiscal,
aproximadamente 90% das cooperativas adotam entre 60 e 80% das praticas
verificadas. Em relacao a auditoria externa, cerca de 60% das
cooperativas adotam de 70 a 80% das praticas. Ja a auditoria interna,
apenas 25,93% das cooperativas adotam tal mecanismo.
Considerando que o conselho fiscal e obrigatorio por lei,
constata-se que as cooperativas adotam grande parte das praticas
verificadas para o conselho. P ara a auditoria externa, que e um
mecanismo apenas indicado e nao obrigatorio por lei, verifica-se que um
percentual menor de cooperativas adota a maioria das praticas
verificadas. P ara a auditoria interna, tambem um mecanismo indicado e
nao obrigatorio por lei, verifica-se ainda maior restricao na adocao
deste mecanismo.
Assim, pode-se observar que, para as cooperativas, a
obrigatoriedade legal da pratica de governanca e monitoramento
influencia positivamente o nivel de adocao dessas praticas de
governanca. Nesse sentido, nao e possivel concluir que existe uma
tendencia para a adocao das boas praticas de governanca indicadas pelos
respectivos codigos, mas sim que a estrutura de governanca e
monitoramento, em razao de uma obrigatoriedade legal, e aquela com maior
tendencia de adocao pelo conjunto das cooperativas estudadas. Com
relacao ao restante das praticas de monitoramento, aquelas apenas
indicadas, e necessario amplo esforco de divulgacao, educacao e
entendimento para que sua adocao cresca. Tais conclusoes sao relevantes,
uma vez que o sistema de governanca corporativa nas organizacoes pode
influenciar as acoes dos players, alterando os incentivos que estes
agentes tem em atuar em favor dos associados (investidores). No entanto,
para generalizacao de tal relacao, serao necessarias novas pesquisas em
maior amostra.
DOI: 10.5700/rege518
Recebido em: 20/9/2011
Aprovado em: 12/4/2013
Luciana Cardoso Siqueira
Mestre em Contabilidade e Controladoria pela Faculdade de Economia,
Administracao e Contabilidade da Universidade de Sao Paulo--Ribeirao
Preto-SP, Brasil
E-mail: lucianasiqueira@usp.br
Sigismundo Bialoskorski Neto
Professor Titular do Departamento de Contabilidade da Faculdade de
Economia Administracao e Contabilidade da Universidade de Sao Paulo
Ribeirao
Preto-SP, Brasil
E-mail: sig@usp.br
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Tabela 1--Porcentagem e numero de cooperativas que adotaram
determinadas praticas de monitoramento
Numero de Porcentual de
cooperativas cooperativas
que adotaram que adotaram
as referidas as referidas
praticas praticas
Verificacao de adocao de praticas de
governanca indicadas ao conselho
fiscal
--A funcao dos conselheiros e 18 66,67%
remunerada?
--O conselho fiscal participa 11 40,74%
anteriormente na tomada de decisoes
sobre investimento?
--O conselho fiscal participa 10 37,04%
anteriormente da aprovacao de
estrategias da cooperativa?
--O conselho fiscal se reune para 27 100%
analisar demonstrativos financeiros?
--O conselho fiscal se reune para 16 59,26%
discutir e analisar as acoes do
conselho de administracao?
Verificacao de adocao de praticas de
governanca indicadas a auditoria
externa
--A cooperativa tem auditoria 18 66,67%
externa?
--Qual orgao de governanca contrata 5 18,52%
a auditoria externa? (Nos casos em
que o conselho fiscal participa da
contratacao, atribui-se 1 ao inves de
0 no banco de dados, ou seja,
existe a adocao desta pratica de
governanca)
--Caso a cooperativa tenha auditoria 13 48,15%
externa, o Conselho Fiscal acompanha
o desenvolvimento dos trabalhos dos
auditores?
--Caso a cooperativa tenha auditoria 18 66,67%
externa, o conselho fiscal utiliza
informacoes geradas pelos auditores
para dar seu parecer nos
demonstrativos financeiros a serem
apresentados na assembleia?
--De quanto em quanto tempo a empresa 18 66,67%
de auditoria e trocada? (Se a
cooperativa realiza rodizio de
auditoria em menos de 5 anos,
considera-se uma adequacao as
indicacoes de melhores praticas
atribuindo-se 1 ao inves de 0 no
de dados)
--Para quem sao apresentados os 2 7,41%
relatorios de auditoria
primeiramente? (Apresentacao do
parecer primeiramente ao CF)
--O que e feito com possiveis 18 66,67%
erros/melhorias apontados no
relatorio de auditoria? (Ponto
positivo se o processo corretivo
acontece internamente ou com empresa
diferente da empresa que audita)
Verificacao de adocao de praticas de 7 25,93%
governanca indicadas a auditoria
interna--A cooperativa tem auditoria
interna?
--Se a auditoria interna e 0 -
terceirizada, a empresa que presta
auditoria interna e a mesma que
presta auditoria externa?
--A auditoria interna se reune com o 4 14,81%
conselho fiscal?
Fonte: Dados da pesquisa.
Tabela 2--Porcentual de cooperativas por numero de
praticas adotadas
No de praticas analisadas
% de cooperativas que 0 1 2 3
adotam N praticas
Do Conselho Fiscal 0,00% 14,81% 14,81% 33,33%
Da Auditoria Externa 33,33% 0,00% 0,00% 3,70%
Da Auditoria Interna 74,07% 11,11% 14,81% -
No de praticas analisadas
% de cooperativas que 4 5 6 7
adotam N praticas
Do Conselho Fiscal 25,93% 11,11% - -
Da Auditoria Externa 18,52% 29,63% 11,11% 3,70%
Da Auditoria Interna - - - -
Fonte: Dados da pesquisa.