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文章基本信息

  • 标题:Administrative reforms in Brazil: a theoretical and critical approach/Reformas administrativas no Brasil: uma abordagem teorica e critica/Reformas administrativas en Brasil: un abordaje teorico y critico.
  • 作者:Capobiango, Ronan Pereira ; do Nascimento, Aparecida de Lourdes ; Silva, Edson Arlindo
  • 期刊名称:Revista de Gestao USP
  • 印刷版ISSN:1809-2276
  • 出版年度:2013
  • 期号:January
  • 语种:Spanish
  • 出版社:Faculdade de Economia, Administracao e Contabilidade - FEA-USP
  • 摘要:A Reforma Administrativa e discutida e debatida em todo o mundo como um processo de adaptacao da maquina publica ao ambiente em que se insere. No entanto, cada pais apresenta um perfil peculiar, com suas limitacoes e suas caracteristicas culturais, que devem ser levadas em consideracao ao se propor alguma alteracao que interfira na vida social de todos que compoem o Estado.
  • 关键词:Democratization;Social service;Social services

Administrative reforms in Brazil: a theoretical and critical approach/Reformas administrativas no Brasil: uma abordagem teorica e critica/Reformas administrativas en Brasil: un abordaje teorico y critico.


Capobiango, Ronan Pereira ; do Nascimento, Aparecida de Lourdes ; Silva, Edson Arlindo 等


1. INTRODUCAO

A Reforma Administrativa e discutida e debatida em todo o mundo como um processo de adaptacao da maquina publica ao ambiente em que se insere. No entanto, cada pais apresenta um perfil peculiar, com suas limitacoes e suas caracteristicas culturais, que devem ser levadas em consideracao ao se propor alguma alteracao que interfira na vida social de todos que compoem o Estado.

Esse Estado, na condicao de um sistema que engloba outros subsistemas, e composto de diversas partes que interagem entre si e se interrelacionam, constituindo um todo para a concepcao dos objetivos que se pretende alcancar. Nessa concepcao, os cidadaos, que fazem parte desse sistema, sofrem influencia das decisoes estabelecidas e influenciam essas mesmas decisoes. Infelizmente, muitas vezes a sociedade civil nao e convidada a participar do processo de formulacao e implementacao de uma acao governamental ao propor uma mudanca. Como consequencia, o Estado se depara com um sistema deficiente, cujas partes nao se encontram em perfeita harmonia, e, por isso, tem seu funcionamento prejudicado.

O tema Reforma Administrativa esta relacionado a mudancas ligadas necessariamente a resistencia em razao do medo do novo e da impossibilidade de se vislumbrar o resultado final a ser alcancado. Maquiavel (2006:26) alertou que "aquele que a introduz tera por inimigos todos os que da velha ordem extraiam privilegios e por timidos defensores todos os que das vantagens da nova ordem poderiam usufruir".

O reconhecimento das bases culturais presentes em um Estado permite conhece-lo melhor e, dessa forma, propor medidas condizentes com uma realidade que, na maioria das vezes, necessita de modificacoes para que, a partir destas, outras medidas possam ser estabelecidas e, aos poucos, uma nova percepcao mais flexivel as mudancas seja introduzida.

Varias reformas tem sido propostas ao longo dos anos por diversos paises, porem, na ansia de querer mudar apenas por mudar, como uma forma de acompanhar as tendencias bem-sucedidas de outros paises, muitos Estados tem suas experiencias de reformas frustradas. Modelos bem implementados em outros paises, quando trazidos para uma realidade distinta daquela em que foram elaborados sem se considerarem os aspectos das bases culturais encontrados, deparam-se com barreiras que impedem seu bom funcionamento e nao apresentam os resultados que buscavam oferecer.

Quando sao reconhecidas as limitacoes de certo modelo no atendimento dos objetivos almejados por um Estado e pelas partes que o compoem, novas propostas sao apresentadas como alternativas capazes de melhorar o funcionamento desse sistema, que, continuamente, necessita ser reajustado e adaptado a uma realidade, em um ambiente dinamico de mudancas permanentes.

Nesse contexto, este ensaio teorico, com base em referencias bibliograficas, busca contextualizar o cenario das reformas administrativas, levantando indagacoes e reflexoes sobre o tema, sem ter a pretensao de esgotar seus pontos especificos e suas tendencias. Para tanto, foram selecionados autores que desenvolveram trabalhos importantes da literatura nacional, principalmente sobre o periodo da segunda metade do seculo XX. Essa periodizacao politico-institucional foi definida em razao de se terem como pano de fundo as reformas no Brasil, para, a partir dai, apresentar uma perspectiva que nao separa as reformas administrativas dos movimentos concomitantes e estruturais ocorridos no plano politico e economico ao longo do processo de modernizacao do pais, incluindo o contexto das transformacoes ocorridas no plano gerencial. Alem desses autores, sao mencionados, da literatura internacional, Whitaker (1980), Denhardt (1990), Pollitt (1993), Osborn e Gaebler (1992), Brudney e England (2003), Bouckaert e Halligan (2008), dentre outros.

Especificamente, pretende-se: apresentar as bases dos sistemas de acao cultural brasileiro; levantar um breve historico da administracao publica brasileira entre 1930 e 1995; apresentar, considerando o contexto historico mundial e nacional, os modelos e tendencias atuais; e incitar algumas reflexoes a respeito das reformas administrativas. As recentes discussoes sobre administracao publica e reformas do Estado tem chamado a atencao de diversos estudiosos que buscam compreender as recorrentes transformacoes implementadas nos mais variados setores publicos no Brasil. Sao transformacoes que objetivam atender as demandas do Estado brasileiro, de um lado, e da sociedade civil, de outro. Nesse sentido, a tematica referente as reformas administrativas gera questionamentos que sustentam diversas discussoes, as quais fazem dessa tematica um assunto sempre relevante e importante para os avancos dos debates e reflexoes.

2. CONSIDERACOES SOBRE AS RAIZES CULTURAIS BRASILEIRAS

O sistema cultural brasileiro, de acordo com Barros e Prates (1996), e formado por quatro grandes subsistemas: institucional (macro); pessoal (micro); lideres (donos do poder); e liderados (subordinados ao poder). Esses subsistemas, caracterizados, respectivamente, pela concentracao de poder, postura de expectador, personalismo e pratica de evitar conflito, articulam-se pelos tracos do formalismo, da lealdade as pessoas, do paternalismo e do formalismo. Essa articulacao pode ser mais bem visualizada na Figura 1.

[FIGURE 1 OMITTED]

Esse sistema de acao cultural e formado pela inter-relacao de todos os componentes, cuja interpretacao esta sintetizada no Quadro 1.

O modelo cultural brasileiro traz consigo as raizes de nossa colonizacao--patrimonialismo e clientelismo. O processo de industrializacao deuse com o surgimento dos engenhos, e as raizes do trabalho coletivo foram vinculadas e confundidas com a escravidao recem-abolida, num processo contrario a industrializacao da Europa, por exemplo, onde os trabalhadores que ingressaram na industria eram livres (NASCIMENTO, 1999).

No ambito das organizacoes, Fleury (1990:22) define a cultura organizacional como:

[...] um conjunto de valores e pressupostos basicos expressos em elementos simbolicos, que em sua capacidade de ordenar, atribuir significacoes, construir a identidade organizacional, tanto agem como elemento de comunicacao e consenso, como ocultam e instrumentalizam as relacoes de dominacao. (FLEURY, 1990:22).

Segundo Medeiros e Vasconcellos (1992), o modelo gerencial adotado nas organizacoes brasileiras nao considera a realidade como um todo, uma vez que exclui os elementos culturais, levando em consideracao apenas o desejo de modernidade.

Com o desenvolvimento da economia, verificada especialmente apos a Segunda Guerra Mundial, as praticas gerenciais pautadas pelo autoritarismo coronelista deixaram de ser aplicaveis, comecando assim a tradicao de importacao de teorias e modelos. A sociedade rural, modelada pela influencia europeia, transforma-se em sociedade urbana, influenciada agora pelos Estados Unidos da America (BARROS; PRATES, 1996).

No contexto da administracao publica brasileira, Martins (2007) busca fortalecer tres proposicoes: a administracao publica brasileira e o Estado brasileiro foram fundados sob a influencia de um etos fortemente patrimonialista, presente na heranca cultural lusitana; o processo de construcao nacional e a trajetoria modernizante da administracao publica brasileira tem buscado implementar formas institucionais antipatrimonialistas, tais como a democracia representativa de massas e o padrao burocratico de administracao publica, respectivamente; e o carater dissociativo entre politica e administracao e indicio da recorrencia e persistencia de uma cultura de modernizacao nacional patrimonialista.

Para uma melhor compreensao do processo de modernizacao da administracao publica brasileira, e importante que sejam observadas as raizes culturais brasileiras, que podem estar na base de algumas praticas existentes ao longo da trajetoria da administracao publica brasileira, conforme revela Caldas (2007:82), por exemplo:

Nosso forte traco autoritario e, ao mesmo tempo, paternalista criou no brasileiro o gosto simultaneo pelo protecionismo e pela dependencia. Fomos acostumados, como povo, a nutrir uma postura de espectador sempre dependente de algo ou alguem--em geral, algum tipo "estrangeiro--que nos leve e nos conduza." (CALDAS, 2007:82).

A importancia da questao cultural transcende as fronteiras da curiosidade ou do debate academico, uma vez que a inovacao nas praticas organizacionais exige a compreensao da dinamica das praticas existentes, para gerar mudanca socialmente apropriada e historicamente enraizada (SPINK, 2007). Nesse sentido, o entendimento dos tracos culturais pode fornecer alguns subsidios para uma melhor compreensao da trajetoria da administracao publica brasileira.

3. ADMINISTRACAO PUBLICA BRASILEIRA: DE 1930 A 1995

A expressao Republica Nova esta relacionada a ascensao de Getulio Vargas ao poder em 1930, tornando-se presidente da Republica. As acoes implementadas por esse governo, que promoveram uma profissionalizacao da Administracao Publica, representaram uma tentativa de rompimento com as oligarquias dominantes. Foi um tempo marcado pela criacao do Departamento de Administracao do Servico Publico (DASP) e por conquistas sociais, como o voto secreto e as leis trabalhistas, alem do direito de voto para as mulheres.

A primeira reforma administrativa, de 1936, conhecida como Reforma Burocratica, teve como caracteristica, segundo Matias-Pereira (2009), a enfase na reforma dos meios em detrimento dos fins, ou seja, focou as atividades de administracao geral; buscou montar um corpo burocratico classico, de funcionarios do Estado, nao contemplando as atividades substantivas; pautouse na teoria administrativa que consagrava a existencia de "principios de administracao"; e adotou como modelo o prescrito na teoria administrativa importada dos paises mais desenvolvidos, buscando modernizar a maquina publica inspirando-se no modelo taylorista/fayoliano/weberiano (COSTA, 2008).

A reforma burocratica, conforme Bresser-Pereira (2009), apesar de ter estabelecido o servico publico profissional e os principios da administracao burocratica, nunca foi concluida.

O que se pregava, a partir da Revolucao de 1930 e com a implantacao do modelo burocratico weberiano, era a racionalizacao da administracao publica, em busca da eficiencia. Na epoca, a reforma do servico publico e o processo de burocratizacao ou racionalizacao, como fenomeno historico derivado da natureza superior da administracao publica burocratica em relacao a administracao patrimonial, eram a melhor maneira de aumentar a eficiencia, eliminar o nepotismo e reduzir a corrupcao (BRESSER-PEREIRA, 2009).

No entanto, a marca do clientelismo se manteve, impossibilitando a pratica do que se propunha. Nesse contexto, a Republica Nova chegou ao fim, em 1937, com um golpe de Estado desfechado pelo mesmo presidente Vargas, e teve inicio o Estado Novo.

Posteriormente, com o golpe militar de 1964, o "modelo classico" foi substituido pelo modelo de "administracao para o desenvolvimento", que visava essencialmente a expansao da intervencao do Estado na vida economica e social e a descentralizacao das atividades do setor publico.

Realizou-se a descentralizacao administrativa do Estado, com a criacao da figura da "Administracao Indireta" e maior autonomia de acao, que incluia pode contratar funcionarios sob regime celetista e nao mais estatutarios. Surgiu a figura do Estado-Produtor de bens e servicos atuando diretamente no dominio economico, como condicao necessaria na fase inicial de desenvolvimento de um pais.

Nesse contexto, foi implementada a segunda Reforma Administrativa, cujo simbolo foi o Decreto-Lei n[degrees] 200 de 1967, que introduziu o triplice sentido da descentralizacao "dentro dos quadros da administracao federal; da administracao governamental para a orbita privada; e da Uniao para os governos locais" e o "estabelecimento do conceito de sistemas administrativos para as funcoes comuns a todos os orgaos, o que em principio facilitou a descentralizacao da gestao de recursos (pessoal, material, financas)" (MARCELINO, 1988 apud COSTA, 2008:275).

Ambas as reformas, de 1936 e de 1967, foram implementadas em contextos de ditadura politica, com restricao a participacao da sociedade. Conforme Bresser-Pereira (1998a), a crise do modelo burocratico de administracao publica, introduzido no pais nos anos 30 pelo governo Vargas, comecou ainda no regime militar, em razao de sua incapacidade de desenraizar as praticas patrimonialistas ou clientelistas da administracao.

A Nova Republica nasceu com o fim do regime militar, num cenario caracterizado por cinco disfuncoes gerais: ineficacia do planejamento governamental; deficiencias de mecanismos de implementacao, coordenacao e avaliacao de acoes de reforma/modernizacao dos orgaos; dissociacao entre planejamento, modernizacao e recursos humanos; atuacao pouco integrada e pouco coordenada de orgaos ligados a area; e pouca prioridade a area de recursos humanos (VIEIRA, 2008).

De acordo com Nilson Holanda:

A capacidade gerencial do Estado brasileiro nunca esteve tao fragilizada; a evolucao nos ultimos anos, e especialmente a partir da chamada Nova Republica, tem sido no sentido de uma progressiva piora da situacao; e nao existe, dentro ou fora do governo, nenhuma proposta condizente com o objetivo de reverter, a curto ou medio prazo, essa tendencia de involucao. (HOLANDA, 1993:165).

A crise se agravou a partir da Constituicao de 1988, quando os constituintes, procurando frear as praticas patrimonialistas favorecidas pela administracao publica descentralizada, promoveram, de acordo com Bresser-Pereira (1998a), um enrijecimento burocratico extremo, que, em conjunto com o patrimonialismo incontido, resultou no alto custo e na baixa qualidade da administracao publica brasileira (BRESSER-PEREIRA, 1998a).

Na sequencia, registra-se a reforma administrativa implementada pelo governo Collor, que promoveu um amplo e profundo rearranjo estrutural, visando a racionalizacao (reducao de gastos) e a desestatizacao (reducao da interferencia do Estado no dominio economico). Nesse sentido, fechou ministerios, promoveu fusao e extincao de instituicoes, determinou afastamento e/ou remanejamento de pessoal, extinguiu, privatizou e descentralizou empresas, alem de ter promovido a desregulamentacao do mercado. Para Lustosa da Costa e Cavalcanti (1991), a reforma tinha um forte componente ideologico--a proposta neoliberal.

A instabilidade politica durante o processo de impeachment do presidente Collor, que culminou com sua renuncia em dezembro de 1992, fez com que o processo de reforma administrativa perdesse seu folego e fosse colocado, momentaneamente, em segundo plano. Em 1994, com a inauguracao do Plano Real e a retomada da estabilidade economica do pais, foram criadas condicoes para a retomada da agenda de reformas implementadas pelo Governo Fernando Henrique Cardoso apos 1995, sob a coordenacao do MARE, capitaneado pelo entao Ministro Bresser-Pereira.

4. MODELOS E TENDENCIAS ATUAIS: NOVA GESTAO PUBLICA X NOVO SERVICO PUBLICO

Ainda que, oficialmente, o aparelho estatal tenha evoluido, passando do modelo burocratico, introduzido na decada de 30, para o modelo gerencial, que o Decreto 200/67 tentou implantar e que foi reafirmado pela reforma de 1998, as praticas da administracao patrimonialista tipica dos Estados que antecederam o avanco do capitalismo industrial ainda sao comuns no cotidiano da administracao publica, em todos os tres niveis de governo e poderes. Em sentido amplo, o termo patrimonialismo tem sido empregado, segundo Ramos (1983), para expressar a cultura de apropriacao daquilo que e publico.

Apesar da evolucao do conceito de Administracao Publica no seculo XX e de o setor publico brasileiro estar vivenciando varias iniciativas de transformacao e modernizacao, a estrutura mecanicista, rigida, inflexivel tem resistido a evolucao e a democratizacao da sociedade (TORRES, 2004).

De acordo com Bresser-Pereira (2009), o pequeno Estado liberal do seculo XIX foi substituido pelo grande Estado social-democratico do seculo XX, assumindo novos papeis sociais (educacao, saude, transporte, seguridade social e assistencia social, cultura, pesquisa cientifica) e economicos (estabilidade macroeconomica, regulacao dos servicos publicos e das atividades monopolistas, fornecimento de infraestrutura publica, politica industrial e de comercio exterior), mas a administracao publica burocratica nao garantiu que fossem prestados ao publico servicos de boa qualidade ou de baixo custo.

A situacao da administracao publica no Brasil pouco se alterou, apesar de todas essas reformas. Gomes (2006) apresenta como justificativa para isso: o fato de a gestao publica brasileira ter sido sempre observada, de modo abstrato, como reflexo de modelos estanques que buscaram a adocao de medidas importadas, inadequadas para resolver os problemas da administracao no Pais.

Schwartzman (1987:58) considera a trajetoria da modernizacao da administracao publica brasileira como "um dificil dilema, que colocaria de um lado a administracao racional e tecnica, associada aos regimes fortes e autoritarios, e de outro, a administracao politizada, deficiente e desmoralizada, que pareceria ser um atributo da democracia e da participacao social".

Na concepcao de Denhardt (1990), o pensamento da administracao publica ao longo dessa trajetoria evoluiu a ponto de criar, criticar e aprimorar modelos e principios de mudanca organizacional planejada, tanto nos niveis micro quanto macro-organizacional, passando de um enfoque organizacional para um enfoque politico-sociologico e tendo como ponto central a tensao entre politica e administracao.

Segundo Salm e Megasso (2009b), o principio que norteia o modelo da administracao publica convencional, aquela que tem na organizacao burocratica sua principal referencia, e a separacao entre politica e administracao. A implementacao desse modelo exige uma base legal e racional que depende ainda de estrategias que norteiam o funcionamento interno e das conjunturas externas que afetam e que sao afetadas pela organizacao publica; trata-se de um modelo que vem sofrendo criticas que, em conjunto com a ascensao do mercado, na qualidade de principal e eficiente alocador de bens e servicos, possibilitam o surgimento de uma nova proposta de administracao publica (SALM; MEGASSO, 2009b).

Nesse cenario, duas vertentes se apresentam como alternativas para a gestao publica: a administracao publica gerencial, sob a egide da Nova Gestao Publica (NGP), e a administracao publica societal, sob a egide do Novo Servico Publico (NSP).

4.1. Nova gestao publica no mundo e no Brasil

Em 1973, a crise do petroleo foi responsavel por deflagrar os mecanismos que provocaram o esgotamento do antigo modelo de intervencao estatal de moldes burocraticos. A crise economica mundial, que se iniciou naquela decada, pos fim a era de prosperidade iniciada no pos-Segunda Guerra Mundial. A crise do petroleo foi, ainda, potencializada pela crise economica mundial, que se agravou ao longo dos anos 80 e provocou um grande periodo recessivo nas economias da maioria dos paises; pela crise fiscal do Estado, baseado no modelo economico proposto por Keynes e que dificultava o financiamento dos deficits da maioria dos governos; pela crise de governabilidade, que demonstrava a incapacidade dos governos de resolver os problemas economicos e sociais de seus paises; e pela emergencia da globalizacao e das inovacoes tecnologicas, as quais levaram a profundas transformacoes na economia e no setor produtivo, que tambem se refletiram no Estado (GOMES, 2006).

Na America Latina, durante os anos 80 e 90, dois processos seguiram trajetorias mais ou menos paralelas, conforme exposto por Glade (2006)--o ajustamento estrutural da economia e a reforma do aparelho administrativo do Estado. Observa-se, ainda, um terceiro processo, a democratizacao, composta de uma variedade de medidas para fortalecer a sociedade civil.

E importante, nesse contexto, que se tenha consciencia do objetivo da reforma, que, na concepcao de Przeworski (2006), e a construcao de instituicoes que deem poder ao aparelho do Estado para fazer o que ele deve fazer e o impecam de fazer o que ele nao deve fazer. O autor argumenta, ainda, que a reforma do Estado deve ser concebida considerando mecanismos institucionais pelos quais os governos possam controlar o comportamento dos agentes economicos privados, e os cidadaos, controlarem os governos.

Desde os primeiros anos da decada de 1980, ve-se crescer uma demanda para tornar o Estado mais eficiente e gerencial (KETTL, 2006). Paises como Canada, Reino Unido, Australia, Nova Zelandia, Japao e Estados Unidos adotaram o conceito de "deixem o administrador administrar", em que a flexibilidade era um principio basico para a reinvencao dos governos (OSBORNE; GAEBLER, 1992; NUNBERG, 1998). Essa filosofia de administracao publica se popularizou, principalmente, com o governo de Margareth Thatcher, a Dama de Ferro, no Reino Unido, e o governo de Ronald Reagan, nos Estados Unidos, cuja principal meta era uma administracao publica mais eficiente e flexivel (FLYNN; STREHL, 1996; ABRUCIO, 1997; KETTL, 2006). Segundo Pereira (2004), a Gra-Bretanha e considerada o grande laboratorio das tecnicas gerenciais aplicadas, e, seguindo essa tendencia, muitos paises comecaram a ensaiar o inicio das reformas de seus Estados.

Foi na decada de 80 que, segundo Abrucio (2005), os Estados Unidos deram inicio a implantacao de reformas administrativas, considerando o modelo gerencial importado da iniciativa privada. De acordo com Bresser-Pereira (2009), a verdadeira reforma da gestao publica somente ganhou impulso nos anos 1980, com o discurso neoliberal e com a eleicao de Margaret Thatcher para primeira-ministra do Reino Unido.

O thatcherismo pode ser qualificado por algumas medidas organizativas e administrativas que caracterizaram a Nova Administracao Publica. Paes de Paula (2005a) sintetizou as seguintes caracteristicas: descentralizacao do aparelho de Estado; privatizacao das estatais; terceirizacao dos servicos publicos; regulacao estatal das atividades publicas conduzidas pelo setor privado; e uso de ideias e ferramentas gerenciais advindas do setor privado.

De acordo com Andion (2012), o modelo da Nova Administracao Publica se apoia em correntes teoricas dos estudos tanto sobre politicas publicas quanto sobre gestao publica, promovendo uma renovacao e uma ruptura no campo da administracao publica nas ultimas decadas. Tais correntes podem ser observadas no Quadro 2.

Segundo Kettl (2006), se por um lado o movimento da Nova Administracao Publica (NAP) e caracterizado por um modelo normativo, constituido por abordagens teoricas que possibilitam, por meio dos principios de mercado, compreender a esfera publica e seu funcionamento, por outro lado, a agenda da NAP foi referencia para a promocao de reformas em muitos paises, com o objetivo de reestruturar o Estado, substituindo o modelo burocratico pelo gerencial, que se baseia na competicao e foca os resultados.

A partir da avaliacao das reformas economicas realizadas em paises como Chile e Mexico, especialistas se reuniram e chegaram a um "consenso" quanto a eficiencia das reformas orientadas para o mercado, denominado Consenso de Washington. Dez medidas baseadas em experiencias do Reino Unido e de outros paises e geradas para a implementacao das reformas foram sintetizadas pelo economista John Williamson. Sao elas: o ajuste estrutural do deficit publico; a reducao do tamanho do Estado; a privatizacao das estatais; a abertura ao comercio internacional; o fim das restricoes ao capital externo; a abertura financeira as instituicoes internacionais; a desregulamentacao da economia; a reestruturacao do sistema previdenciario; o investimento em infraestrutura basica; e a fiscalizacao dos gastos publicos (BATISTA, 1995 apud PAES DE PAULA, 2005a).

De acordo com Bresser-Pereira (2006), a Nova Administracao Publica foi implementada em resposta a crise fiscal, a crise no modo de intervencao do Estado, a crise do modelo burocratico, responsavel pela administracao do Estado, e tambem a crise politica. Visava, em sintese, a transformacao da cultura burocratica que permeava a administracao publica brasileira, incutindo uma nova cultura denominada gerencial.

O termo "cidadao-cliente" e utilizado, ate mesmo, como forma de aproximar a administracao publica da logica de mercado. Esse processo se refere a adaptacao e aplicacao das ideias e ferramentas de gestao mais recentes do setor privado no setor publico, como, por exemplo, os programas de qualidade, a reengenharia organizacional, a administracao participativa e outras (BRESSER-PEREIRA, 1998b).

Um dos objetivos do modelo gerencial diz respeito a definicao da forma de propriedade e gestao das instituicoes publicas: considera-se estatal o nucleo estrategico e as atividades exclusivas; publico nao-estatal, os servicos exclusivos que podem ser publicizaveis; e as atividades cuja producao e voltada para o mercado, atividades que podem ser privatizadas (MARE, 1995).

No Brasil, as propostas da vertente gerencial foram concebidas e implementadas, conforme Paes de Paula (2005a), durante o governo de Fernando Henrique Cardoso (1994-2002), com a presenca ativa do ex-ministro da Administracao e Reforma do Estado, Luiz Carlos Bresser Pereira. A autora acrescenta, ainda, o fato de a vertente ter se tornado hegemonica a partir do momento em que a alianca social-liberal alcancou o poder e implementou a administracao publica gerencial.

A administracao publica gerencial tem como principais objetivos, segundo Bresser-Pereira (1998b): aprimorar as decisoes estrategicas do governo e da burocracia; oferecer condicoes que garantam a propriedade e o contrato, para que se promova um bom funcionamento dos mercados; garantir autonomia e capacitacao gerencial do administrador publico; e certificar a democracia por meio da prestacao de servicos publicos voltados para o "cidadao-cliente" e controlados pela sociedade.

A administracao publica gerencial deve ter as seguintes caracteristicas para atingir esses objetivos:

* administracao profissional, autonoma e organizada em carreiras;

* descentralizacao administrativa;

* maior competicao entre as unidades administrativas;

* disciplina e parcimonia no uso dos recursos;

* indicadores de desempenho transparentes;

* maior enfase nos resultados; e

* enfase no uso de praticas originadas no mercado (PAES DE PAULA, 2005a: 131-132).

A implementacao do modelo da nova gestao publica, cujas raizes se encontram na economia de mercado, nas teorias de custos e beneficios e na teoria da escolha publica, depende nao so dos ditames legais que autorizam a privatizacao, a terceirizacao e a adocao de outros mecanismos de mercado para a producao dos servicos publicos, mas tambem da preparacao da sociedade para aceitar essa nova orientacao para a producao dos servicos publicos (SALM; MENEGASSO, 2009b).

De acordo com Ramos (1989) e Arendt (2005 apud SALM; MENEGASSO, 2009b), o principal problema do modelo da nova gestao publica e observado na usurpacao da esfera privada, uma vez que e o mercado e nao a comunidade politicamente articulada a principal referencia para a administracao publica. De acordo com Grey (1996), as criticas dirigidas ao gerencialismo se acirraram quando o argumento da eficiencia de suas proposicoes invadiu o setor publico.

A reforma de 1998 deixou a desejar em relacao as mudancas propostas (DINIZ, 2001; NOGUEIRA, 2005; ABRUCIO, 2007). Tal avaliacao e feita tambem a respeito de outros paises precursores na aplicacao da Nova Administracao Publica (POLLITT, 1993).

Paes de Paula (2005a) aponta as seguintes limitacoes da nova administracao publica: constituicao de uma nova elite burocratica, centralizacao do poder nas instancias executivas, inadequacao da aplicacao das tecnicas e praticas advindas do setor privado no setor publico, dificuldade em lidar com a complexidade dos sistemas administrativos e a dimensao sociopolitica da gestao, incompatibilidade entre a logica gerencialista e o interesse publico.

Conforme exposto por Goodsell (2003), tais limitacoes alimentam uma critica crescente ao modelo, abrindo caminho a novas propostas para a producao dos servicos publicos.

4.2. Novo Servico Publico

Kettl (2006), Denhardt J. V. e Denhardt, R. B. (2003) e Salm e Menegasso (2006 apud SALM; MENEGASSO, 2009b) afirmam existirem tres modelos relevantes em administracao publica: o modelo da administracao publica convencional, em que a burocracia e que produz o bem publico ou os servicos publicos; o modelo da nova gestao publica, no qual o mercado e o principal alocador dos servicos publicos; e, ainda, um terceiro modelo, que seria o novo servico publico, em que o bem publico ou o servico publico e coproduzido com a sociedade e pela sociedade.

O bem publico abrange, segundo Meirelles (2000), tudo aquilo que tenha valor economico ou moral e que seja suscetivel de protecao juridica. A coproducao, por sua vez, refere-se, de acordo com Brudney e England (2003:59), "a uma mistura critica de atividades prestadas por agentes e cidadaos para a provisao de servicos publicos". O cidadao torna-se protagonista na prestacao do servico publico e na promocao da transformacao social (WHITAKER, 1980; ALFORD, 2002; BRUDNEY; ENGLAND, 2003; MARSHALL, 2004; COOPER; KATHI, 2005).

Salm e Menegasso (2009b) utilizam o conceito de Novo Servico Publico para denominar o modelo emergente que se mostra presente sempre que a comunidade ou o cidadao coproduzem o bem publico ou os servicos publicos com os agentes publicos. O autor discute que este modelo ainda e incipiente e pressupoe a existencia de condicoes apropriadas para sua implementacao e operacionalizacao, e que a producao do desenvolvimento sustentavel dele decorrente pressupoe a existencia de capital social nas comunidades.

De acordo com Salm e Menegasso (2009a), as bases epistemologicas do modelo do novo servico publico, elaboradas por Denhardt, J. V. e Denhardt, R. B. (2003), tem por principio que o ser humano e, antes de tudo, um ser politico que age na comunidade; que a comunidade, politicamente articulada, requer a participacao do cidadao para a construcao do bem comum; e que o bem comum precede a busca do interesse privado.

O Novo Servico Publico surge como uma alternativa a Nova Gestao Publica, inspirado na teoria politica democratica. Objetiva, particularmente, a conexao entre cidadaos e seus governos, com abordagens alternativas a gestao e ao modelo organizacional e sendo mais humanistico na teoria da administracao publica (DENHARDT, 2004 apud VIEIRA, 2008).

Arranjos de governanca, nao apenas estatais, capazes de lidar com problemas complexos requerem um modelo de Governanca publica que opere um tipo de estado-rede, com carater consensual, relacional e contratual, caracterizado pela coproducao ou cogestao de politicas publicas e por arranjos multi-institucionais entre Estado, iniciativa privada e terceiro setor (BOUCKAERT; HALLIGAN, 2008; OSBORNE, 1998).

Salm e Menegasso (2009a) discutem a coproducao dos servicos publicos a partir da complementaridade dos modelos e da proposta de administracao publica. Segundo esses autores, a complementaridade dos modelos pode ocorrer por meio: da organizacao burocratica em que haja a gestao participativa obtida mediante estruturas de consentimento; das organizacoes sociais com caracteristicas isonomicas; de comunidades engajadas com a producao do bem publico; da responsabilidade social das empresas, quando elas produzem um bem publico, fato amplamente ignorado pelos estudiosos da administracao publica; e do cidadao, em seu papel de ser politico, produzindo o bem publico.

No Brasil, a administracao publica societal tem sua origem, segundo Paes de Paula (2005a), nos movimentos sociais iniciados nos anos 1960 e que se desdobraram nas decadas seguintes, apesar dos impactos sofridos no governo militar. Como exemplos de praticas surgidas dentro desse contexto, citam-se os foruns tematicos, que surgiram no final dos anos 80 e se constituem em uma oportunidade para o debate de problemas publicos, e os conselhos gestores de politicas publicas, tambem surgidos no mesmo periodo, durante o processo de redemocratizacao brasileira, incorporados a Constituicao Federal promulgada em 1988 (PAES DE PAULA, 2005a). Carvalho e Felgueiras (2000) acrescentam como exemplos os processos de orcamentos participativos, surgidos de uma experiencia do conselho popular do municipio de Vila Velha.

A vertente societal propoe um novo modelo de gestao publica, opondo-se ao estilo burocratico de gestao e buscando uma ampliacao da democracia por meio de uma maior insercao e participacao da sociedade organizada na administracao publica. A conquista da presidencia da Republica por Luiz Inacio Lula da Silva em eleicoes presidenciais passadas resultou em uma expectativa de que esta vertente se tomasse a marca do governo federal. O observado, porem, e que nao houve um rompimento de fato com o modelo anterior, mais sim a continuidade das praticas gerencialistas nos diversos campos, ate mesmo nas politicas sociais (PAES DE PAULA, 2005a).

Paes de Paula (2005b) faz um contraste entre o centralismo e o estruturalismo da Administracao Publica Gerencial e a abertura e o dinamismo da Administracao Publica Societal, conforme exposto no Quadro 3.

A necessidade de mudancas e modernizacoes no modo de gestao das organizacoes publicas e senso comum, independentemente da corrente ideologica ou do papel desempenhado por elas, do governo ou da sociedade civil. Dessa forma, alguns pontos devem ser objeto de reflexao por todos os atores que, direta ou indiretamente, sao afetados pelas reformas administrativas. Na secao seguinte alguns desses pontos sao apresentados.

5. REFLEXOES SOBRE AS REFORMAS ADMINISTRATIVAS

Varios estudiosos se debrucam sobre o tema das reformas, buscando encontrar e desvendar os motivos que impedem o alcance dos objetivos e metas propostos. Rezende (2004), por exemplo, lista a chamada "falha sequencial" relacionada a descontinuidade, ao abandono e ao termino de processos de intervencao antes que seus objetivos sejam alcancados ou que tenha ocorrido melhoria na performance do aparato burocratico.

Rezende (2002) reuniu em seu estudo dezessete explicacoes para essa "falha sequencial" encontradas na literatura: a institucionalizacao (CAIDEN, 1999); a resistencia (KAUFMAN, 1995); ondas de reformas (LIGTH, 1997); conflito de principios (KAUFMAN, 1971); conflito estrutural (COE, 1971); atencao dos atores estrategicos (MARCH et al., 1993); natureza da reforma (multiplos objetivos, largo escopo, alta complexidade) (MARCH et al., 1993); contradicoes, ambiguidades e incerteza (PETERS; SAVOIE, 1996; MARCH; OLSEN, 1989); garbage can (COHEN; MARCH; OLSEN, 1972); descentralizacao x coordenacao (KAUFMAN, 1995); diversidade de interesses x one size fits all e dilemas de acao coletiva (PRESSMAN; WILSAVSKY, 1971); poder (SEIDMAN, 1998); contradicoes de funcoes (SEIDMAN, 1996); absorcao de incertezas (DESVEAUX, 1994); altas expectativas (PETERS; SAVOIE, 1996); e demandas conflitantes (BRUNSON; OLSEN, 1993).

No presente estudo, chama-se a atencao para as duas primeiras explicacoes, relacionadas ao solido enraizamento dos elementos a serem reformados, considerando-se que as "reformas ocorrem em ambientes altamente institucionalizados que tornam as mudancas muito lentas e com reduzida efetividade", e a resistencia organizada dos setores afetados pelas reformas, pelo fato de que as "reformas enfrentam resistencia organizada por tres razoes: a) beneficios gerados pelo status quo; b) oposicao calculada; e c) reduzida habilidade para a mudanca" (CAIDEN, 1999; KAUFMAN, 1995 apud REZENDE, 2002:62).

Gomes (2006) afirma que a administracao publica e caracterizada por multiplas dimensoes, apresentando, de modo simultaneo, caracteristicas dos modelos patrimonialista, burocratico e gerencial. O que se pode denominar de hibridismo e apontando pelo referido autor como a razao de as iniciativas de reforma, que propuseram a substituicao de um modelo por outro, nao terem conseguido modificar sua critica a situacao.

Entende-se, na abordagem apresentada por este trabalho, que e necessario compreender os mecanismos relacionados a mudanca, como eventuais resistencias, para que ela seja institucionalizada e consiga alcancar, de fato, seus objetivos. Para que as reformas possam ser compreendidas como mudancas organizacionais, devem-se levar em consideracao os aspectos culturais do pais, como uma primeira etapa a ser observada, e nao somente tentar moldar modelos de reforma adotados por outros paises em um pais cuja realidade e totalmente peculiar.

Nao sao suficientes mudancas apenas estruturais, uma vez que e necessario modificar os proprios processos decorrentes na gestao publica. Matos (1988) faz uma distincao entre Modernizacao Organizacional (MO) e Modernizacao Administrativa (MA). A MO abrange, segundo o autor, dimensoes politicoeducacionais, desenvolvidas de modo constante nas organizacoes sociais com o objetivo de gerar transformacoes nas relacoes de trabalho e de poder, nos custos e nos resultados organizacionais. A MA, por sua vez, e uma tentativa limitada de modificar a organizacao somente no campo estrutural, modificando normas e procedimentos e simplificando rotinas.

E preciso assumir a modernizacao como processo continuo,

[...] abrangendo todos os niveis e segmentos organizacionais e integrando as dimensoes tecnica, politica e comportamental. Simplificacao de estruturas e procedimentos: racionalizacao de tempo e espaco; criterios e valores de comportamento, bem como a melhoria de qualidade e de relevancia social dos servicos e bens da organizacao, como objetivos a serem alcancados a partir do esforco consistente e engajado dos atores organizacionais, ocupantes ou nao de funcoes gerenciais. Necessidade de reciclar as praticas e relacoes de poder e substituir o autoritarismopaternalismo burocratico por um regime administrativo pautado em valores e mecanismos que garantam o respeito mutuo nas relacoes de trabalho e nas relacoes dos agentes organizacionais com o ambiente externo. (MATOS, 1988:1).

A mudanca organizacional e um assunto desafiador, seja por sua profundidade e complexidade, seja pela variedade de enfoques existentes. As correntes ora dominantes tornam-se ultrapassadas dado o fluxo constante de inovacao e renovacao e, ainda, as rupturas que ocorrem no meio do desenvolvimento das ideias. Dessa forma, e considerando as caracteristicas do ambiente em que as organizacoes se inserem e toda sua dinamica, ocorre o surgimento de novas abordagens organizacionais e o abandono do paradigma mecanicista das mudancas puramente estruturais.

No entanto, deve-se considerar o fato de que o ambiente, por si so, nao provoca mudancas dentro da organizacao; sao as pessoas que criam novos rumos e cursos estrategicos. Nesse sentido, a mudanca organizacional deve ser entendida e trabalhada nao somente sob a otica de estrategias, processos ou tecnologias, mas como uma mudanca de relacoes: do individuo com a organizacao, dele com seus pares, da organizacao com a sociedade, do individuo com a sociedade e dele consigo mesmo.

Para que haja esse entrosamento entre as partes, exigem-se do setor publico transparencia e seriedade nos servicos prestados. Para Barrett (2002), sao os cidadaos os primeiros a conhecer se os recursos publicos estao sendo utilizados de modo apropriado e o que esta sendo alcancado com eles. Entende-se, dessa forma, que e de fundamental importancia maior participacao dos cidadaos no processo de formulacao e implantacao de uma reforma administrativa, para uma atuacao conjunta com seus representantes.

Os desafios para um bom relacionamento entre governo e sociedade civil devem ser superados por ambas as partes. De acordo com Resende e Teodosio (2008), o governo necessita aprender a gerenciar, compartilhando o poder, e as organizacoes da sociedade civil, de seu lado, devem cada vez mais superar diferencas, avancar em suas praticas de gestao e, tambem, no proprio controle social sobre suas atividades, de modo a atuar no espaco publico local e alcancar os resultados esperados de sua atuacao.

Em muitos locais ja vem sendo consolidados os novos mecanismos de participacao, que, conforme Schommer (2003), compreendem os conselhos municipais e estaduais, o orcamento participativo e a incorporacao e revalorizacao de organizacoes tradicionais, como associacoes de bairro, clubes de maes, grupos de jovens e da terceira idade, conselhos de pais nas escolas e outros.

Nesse sentido, reforca-se a ideia introduzida pelo novo servico publico de unificar os esforcos dos cidadaos, dos grupos de individuos e do governo para o oferecimento de um servico publico que atenda todos os seus usuarios com a qualidade que todos merecem e a que tem direito.

6. CONSIDERACOES FINAIS

A trajetoria modernizante da administracao publica brasileira representa a tentativa de substituicao da administracao patrimonial pela burocratica, e revela, na perspectiva do Estado, uma dificil compatibilizacao e uma relacao de disfuncionalidade reciproca entre politica e administracao, entre burocracia e democracia. Essa trajetoria indica que o etos patrimonialista e uma forca social dinamica constitutiva desse processo (MARTINS, 2007).

As reformas administrativas no Estado brasileiro apresentam-se como tentativas de evolucao, mas, apesar de o discurso propagar rupturas drasticas, na pratica elas nao se confirmam. De fato, uma revolucao demandaria algo completamente novo, que rompesse em definitivo com toda a heranca positiva ou negativa, o que nao seria exequivel. Nesse sentido, considerando a historia dos processos de reformas e modernizacoes promovidas na esfera da administracao publica brasileira, e possivel afirmar que o que se verifica e a tentativa de eliminar praticas cujas aplicacoes estao esgotadas.

Contudo, apesar de se verificar periodicamente, ao longo dos ultimos 80 anos, a tentativa de introducao de novas praticas, visando a melhoria da performance das instituicoes publicas, e perceptivel que ainda nao foi possivel, sequer, eliminar de fato alguns tracos, como o patrimonialismo. Essa heranca, herdada da Velha Republica, tem consequencias prejudiciais internamente a administracao publica e compromete a qualidade e a quantidade dos servicos ofertados a populacao.

Verifica-se, entretanto, que os movimentos de reforma implantados a partir do Governo Getulio Vargas contribuiram para a evolucao da administracao publica, apesar das disfuncoes apresentadas paralelamente. Talvez a grande falha esteja, exatamente, no fato de que os proponentes das novas propostas, ao se fascinarem pelo novo, ao se renderem a necessidade do discurso inflamado contra os antecessores, ignorem a realidade e promovam as reformas apenas no plano do "palanque", no plano tatico, chegando, as vezes, ao nivel estrategico, mas sem criar as condicoes para sua operacionalizacao.

Alias, e preciso chamar a atencao para o fato de que, nesses planos mirabolantes, percebe-se sempre a importancia atribuida aos gestores e, eventualmente, a importancia da inclusao da sociedade civil nos movimentos de mudanca; aos servidores publicos que nao ascenderam a condicao de gestores, e que sao obviamente a maioria, e atribuido o papel de resistentes a mudanca. A administracao publica e realizada por um contingente de cidadaos que, a exemplo daquela maioria a quem seus servicos se destinam, em geral tambem nao tem direito a voz, sendo excluidos da construcao e implantacao dos processos de mudanca.

Na percepcao dos autores deste ensaio, os caminhos para a transformacao da administracao publica nao se iniciam pela transformacao dos elementos que compoem o subsistema dos lideres, representado pelo paternalismo. Essa transformacao deve ser iniciada pelos individuos que compoem o subsistema dos liderados, cujo sistema dominante nao lhes permite sair da condicao de "expectador" ou os estimula a continuar adotando a postura de "evitar o conflito". Ao transferirem as responsabilidades para cima ou deixarem de exercer sua cidadania, os individuos desse subsistema contribuem para a manutencao da concentracao de poder na mao de poucos, ao mesmo tempo em que alimentam as praticas personalistas.

Nesse sentido, compreende-se que as contribuicoes (nao as disfuncoes!) do modelo burocratico idealizado por Weber, que deram vida, de fato, as organizacoes, particularmente a meritocracia, aliadas as contribuicoes do modelo gerencial, especialmente no que se refere a retirar o foco do processo, levando-o para os resultados propriamente ditos, constituem avancos fundamentais para a administracao publica. Somando-se a essas contribuicoes a inclusao da sociedade civil no processo de cogestao do servico publico, introduzida pela filosofia do Novo Servico Publico, parece-nos possivel fechar um circulo para que, finalmente, o governo possa ser realmente "do povo, pelo povo e para o povo", como disse Abraham Lincoln, ainda no seculo XIX, ao definir o significado de um governo democratico.

No que diz respeito as novas tendencias da administracao publica brasileira, ainda em processo de construcao, sugere-se a elaboracao de pesquisas sobre a consolidacao ou nao das novas abordagens na gestao publica.

7. REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS

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DOI: 10.5700/rege487

Recebido em: 15/8/2011

Aprovado em: 21/11/2012

Ronan Pereira Capobiango

Professor do Departamento de Ciencias Contabeis e Juridicas da Universidade

Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri--Teofilo Otoni-MG, Brasil

Mestre em Administracao pelo Programa de Pos-Graduacao em Administracao da Universidade Federal de Vicosa

Graduado em Ciencias Contabeis pela Universidade Federal de Vicosa

E-mail: ronan.capobiango@ufvjm.edu.br

Aparecida de Lourdes do Nascimento

Professora da Faculdade Cenecista de Vila Velha--Vila Velha-ES, Brasil

Mestre em Administracao pelo Programa de Pos-Graduacao em Administracao da

Universidade Federal de Vicosa. Especialista em Qualidade e Produtividade pela

Universidade Federal do Espirito Santo. Graduada em Ciencias Contabeis pela

Faculdade de Ciencias Contabeis e Administrativa de Cachoeiro de Itapemirim

E-mail: aparecida@incaper.es.gov.br

Edson Arlindo Silva

Professor do Departamento de Administracao e Contabilidade, vinculado

ao Centro de Ciencias Humanas, Letras e Artes da Universidade

Federal de Vicosa--Vicosa-MG, Brasil

Doutor em Administracao. Atua como

professor-pesquisador e orientador junto ao Programa de Pos-Graduacao em Administracao

E-mail: edsonsilva@ufv.br

Walmer Faroni

Professor do Departamento de Administracao e Ciencias Contabeis da

Universidade Federal de Vicosa--Vicosa-MG, Brasil

Doutor em Administracao pela Universidade de Valencia-Espanha

Graduado em Administracao pela Universidade Federal de Vicosa

E-mail: w.faroni@ufv.br
Quadro 1--Modelo para interpretacao da cultura brasileira

Subsistemas      Tracos            A sociedade brasileira ...
                 culturais

dos lideres      personalismo      valoriza mais o grupo de
                                   "pertenca" do que o individuo

                 paternalismo      apresenta um egocentrismo
                                   dependente, com a construcao de
                                   um capital social baseado nas
                                   relacoes de poder

                 concentracao      baseia-se na
                 de poder          hierarquia/subordinacao
institucional
                 formalismo        apresenta uma discrepancia entre
                                   a conduta concreta e as normas
                                   prescritas

                 impunidade        tem alto grau de tolerancia
                                   quando acontece algo com
                                   alguem do grupo

                 espectador        tem baixa iniciativa, pouca
dos liderados                      capacidade de realizacao e
                                   transfere a responsabilidade
                                   para as liderancas

                 flexibilidade     convive com a hierarquia em um
                                   ambiente de igualdade de fato

                 evitar conflito   usa solucoes indiretas
pessoal                            (terceiros) entre polos
                                   divergentes

                 lealdade as       tem na atracao pessoal seu mais
                 pessoas           forte elemento de coesao social,
                                   sem esquecer da atracao pelo
                                   prestigio do grupo

                 personalismo      valoriza mais o grupo de
                                   "pertenca" do que o
                                   individualismo

Fonte: BARROS; PRATES, 1996.

Quadro 2--Correntes que formam a Nova Administracao Publica

Correntes     Neoinstitucionalismo         Gerencialismo

Principais    Ostrom (1986),               Pollitt (1993),
autores       Williamson (1985),           Osborn e Gaebler (1992),
              Kaufman(1998)                Ferlie et al. (1999),
                                           Kettl (2003)

Teorias       Teoria da Agencia            Gerencialismo

              Teoria das                   Neogerencialismo
              Escolhas Publicas

              Institucionalismo da
              Escolha Racional

              Institucionalismo da
              Economia Politica

Foco          Entender as leis que         Ampliacao do desempenho
              estruturam a acao dos        dos gestores publicos a
              atores politicos, de         partir de sua
              modo a construir teorias     profissionalizacao.
              sobre a administracao
              publica e a politica,
              tendo como referencia
              a economia neoclassica.

Correntes     Boa Governanca

Principais    Kooiman (1993),
autores       March e Olsen (1989)

Teorias       Governanca Corporativa

              Teoria dos Custos de Transacao

Foco          Promocao de um estilo otimo de
              acao publica e novos arranjos
              institucionais na fronteira
              entre esfera publica e privada.

Fonte: ANDION, 2012:8-9.

Quadro 3--Limites e pontos positivos da Administracao
publica gerencial e societal

                    LIMITES

Administracao       --Centralizacao do processo decisorio,
Publica Gerencial   nao estimulando a elaboracao de instituicoes
                    politicas mais abertas a participacao social

                    --Enfase nas dimensoes estruturais em detrimento
                    das dimensoes sociais e politicas da gestao

                    --Implementacao de modelo de reforma e gestao
                    publica inspirado nas recomendacoes e no design
                    sugeridos pelo movimento internacional de
                    reforma de Estado

                    --Inexistencia de uma nova proposta para
                    organizacao do aparelho do Estado

Administracao       --Inexistencia de alternativas mais sistematicas
Publica Societal    de gestao coerentes com seu projeto politico

                    --Falta de uma estrategia que articule as
                    dimensoes economico-financeira, institucional-
                    administrativa e sociopolitica da gestao publica

                    PONTOS POSITIVOS

Administracao       --Clareza em relacao a organizacao do aparelho
Publica Gerencial   do Estado e dos metodos de gestao

                    --A existencia de metodos gerencialistas que vem
                    melhorando a eficiencia do setor publico,
                    especialmente no campo economico-financeiro

Administracao       --Busca elaborar um projeto de desenvolvimento
Publica Societal    que atenda aos interesses nacionais

                    --Construcao de instituicoes politicas e
                    politicas publicas mais abertas a participacao
                    social e voltadas para as necessidades dos
                    cidadaos

Fonte: PAES DE PAULA, 2005b:46.
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