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  • 标题:Management of the Third Sector: a social practice?/Gestao do Terceiro Setor: uma pratica social?/Gestion del Tercer Sector: ?una practica social?
  • 作者:Soares, Alexandra Carla Aguiar Antunes ; Melo, Marlene Catarina de oliveira Lopes
  • 期刊名称:Revista de Gestao USP
  • 印刷版ISSN:1809-2276
  • 出版年度:2010
  • 期号:January
  • 语种:Spanish
  • 出版社:Faculdade de Economia, Administracao e Contabilidade - FEA-USP

Management of the Third Sector: a social practice?/Gestao do Terceiro Setor: uma pratica social?/Gestion del Tercer Sector: ?una practica social?


Soares, Alexandra Carla Aguiar Antunes ; Melo, Marlene Catarina de oliveira Lopes


1. INTRODUCAO

O atual cenario do Terceiro Setor brasileiro passa por transformacoes significativas, principalmente nos papeis desempenhados na formacao e reconhecimento desse espaco, apresentando varios desafios de ordem politica, economica, ideologica e social. Segundo Falconer (2000), esses desafios surgem para essas organizacoes em razao de sua atuacao--se sao mal geridas, excessivamente dependentes, amadoras e asistencialistas--, obrigando-as a promover ajustes organizacionais e de atuacao na sociedade.

Nessa perspectiva, Falconer (2000) e Hudson (1999) defendem que a legitimacao das praticas gerenciais do Terceiro Setor e necessaria para aprimorar o gerenciamento das organizacoes, reforcando a necessidade de mecanismos de gestao eficazes e compativeis com a realidade delas, para que seus objetivos sejam atingidos. Percebe-se entao que, para atender a essas exigencias e necessidades impostas pela sociedade e pela propria natureza do setor, e a fim de garantir sua sobrevivencia, essas organizacoes comecaram a buscar meios e acoes estrategicas.

Desse modo, acredita-se que configurar as praticas gerenciais dos gestores de organizacoes do Terceiro Setor como uma pratica social proporcionara uma melhor compreensao tanto dos processos e estruturas dessas organizacoes quanto das transformacoes e da profissionalizacao ocorridas no Terceiro Setor de Belo Horizonte e da sociedade de um modo geral.

2. PERCURSO METODOLOGICO

Os procedimentos metodologicos utilizados foram de carater qualitativo, com o uso da entrevista estruturada como metodo de coleta de dados. O recorte adotado privilegiou o campo da gestao, que emerge como um dos maiores desafios vivenciados pelas organizacoes do Terceiro Setor. A amostra foi composta de 20 gerentes--12 mulheres e 8 homens--com no minimo 3 anos de trabalho efetivo no cargo gerencial das diversas areas de atuacao de organizacoes do Terceiro Setor localizadas no municipio de Belo Horizonte. A analise de dados baseou-se na analise de conteudo e tematica, e, de acordo com Melo (2003), os dados coletados passaram por tres fases de tratamento: na primeira fase tratou-se da preparacao das entrevistas, que foram transcritas e as respostas agrupadas com as respectivas questoes, conforme o roteiro de perguntas; na segunda fase executou-se a tabulacao quantitativa, com a identificacao e agrupamento dos componentes das respostas dos entrevistados de acordo com o tema da pergunta, seguindo-se os principios de analise de conteudo (BARDIN, 1979); e na terceira e ultima fase do processo realizou-se a tabulacao qualitativa/tematica, com a categorizacao de temas, segundo os objetivos da dissertacao, estruturados em uma planilha que permite o agrupamento dos extratos mais significativos retirados das entrevistas transcritas, de acordo com a relacao dos objetivos do estudo e do referencial teorico adotado.

3. O TERCEIRO SETOR

O Terceiro Setor vem recebendo grande destaque tanto na esfera academica quanto no ambito das politicas sociais. A ausencia de consenso sobre seu conceito e decorrente da sua heterogeneidade, de acordo com Costa Junior (1998), e esta aliada as ideias amplas e aos imprecisos atributos proprios do setor. Assim, diante dos resultados desta pesquisa, pode-se conceituar o Terceiro Setor como um setor composto de organizacoes diversificadas que se caracterizam pelo valor nao economico, fundadas pela iniciativa privada (sociedade civil) com interesses publicos e sociais, com contornos participativos, cooperativos e solidarios, e apoiadas no trabalho contratado (SOARES, 2008).

Preocupadas e movidas pela acao social e baseadas em valores, as organizacoes do Terceiro Setor nao se dedicavam a administrar no sentido classico do termo. Falconer (2000) e Hudson (1999) afirmam que esse enfoque era visto como sendo do mundo dos negocios e nao apropriado para essas organizacoes. Mas, com o grande crescimento do setor e o aumento dos desafios e problemas que passaram a ameacar a sua sobrevivencia, essas organizacoes comecaram a discutir a gestao.

As organizacoes do Terceiro Setor, a partir da decada de 90, alem de perceberem que a administracao e importante para o seu sucesso, segundo Hudson (1999), viram-se tambem obrigadas a repensar a sua missao, a sua forma de atuacao e seu funcionamento, para enfrentar os desafios que colocariam em xeque sua forma de gestao (TENORIO, 2006).

Para Teodosio (1999:290), "o campo da gestao e considerado um dos espacos centrais para o avanco das organizacoes do Terceiro Setor" e necessita de um desdobramento no desenvolvimento de instrumentos e mecanismos gerenciais capazes de mensurar e monitorar processos, resultados e impactos nos projetos executados, a fim de que seus objetivos sociais sejam alcancados (ASSIS, 2005). Sendo assim, a crescente tendencia a profissionalizacao das organizacoes do Terceiro Setor esta exigindo delas e de seus gestores, para sua efetividade e consolidacao, a configuracao de seu campo gerencial como uma pratica social, o que implica dizer que a gestao deve ter uma concepcao mais realista, flexivel e integrada da realidade do Terceiro Setor.

4. AS PERSPECTIVAS DO MODELO DE ANALISE GERENCIAL DE REED (1997)

No entender de Reed (1997:6), o estudo da funcao gerencial nas organizacoes contemporaneas fundamenta-se em questoes teoricas e em praticas sociais dos processos e estruturas de gestao, que variam de acordo com o contexto social no qual se desenvolveram, "repercutindo os valores culturais e os atributos ideologicos a elas vinculados". Nesse sentido, o autor distingue tres abordagens para o aprofundamento dos estudos da gestao: as perspectivas tecnica, politica e critica. O autor ainda propoe uma quarta perspectiva de analise, denominada praxeologica, por compreender a gestao como uma pratica social.

Na perspectiva tecnica, a gestao e orientada para meios centrados nos mecanismos estruturais neutros e racionais que objetivam o alcance de resultados coletivos preestabelecidos e inatingiveis sem sua aplicacao. Assim, as estruturas organizacionais sao concebidas como mecanismos formais de coordenacao e controle do desempenho de tarefas, determinantes de comportamentos dos atores sociais. Os modelos de relacoes sociais institucionalizados sao impostos, e os gestores exercem uma especie de controle limitado centrado no desenvolvimento organizacional, que e predeterminado e, portanto, independente da vontade e da acao humana (REED, 1997).

Na segunda perspectiva, a politica, Reed (1997) destaca a questao do conflito de interesses entre grupos que se relacionam com as organizacoes, caracterizando o ambiente organizacional como de grandes incertezas. Nessa abordagem, percebe a gestao como resultante de uma dinamica da acao humana, constituindo-se como um sistema politico em que imperam transacoes negociadas entre diferentes interesses dos stakeholders de uma dada organizacao.

A perspectiva critica completa a reducionista abordagem politica, que, ao enfatizar a acao humana, negligencia, de certa forma, os aspectos institucionais inerentes as estruturas de poder e de controle da economia politica de uma dada sociedade. Nessa perspectiva, as estruturas e estrategias de gestao sao tratadas como apoio para a promocao e protecao dos interesses politicos e economicos da classe dominante de um modo de producao, alem de definirem imperativos para a propria sobrevivencia do sistema economico. Assim sendo, tanto os gestores quanto os modelos organizacionais sao produtos diretos do sistema socioeconomico estabelecido.

Pode-se concluir que nenhuma dessas tres perspectivas e capaz, isoladamente, de tratar, de forma satisfatoria, as ambiguidades e complexidades das praticas gerenciais. Dessa forma, ao apresentar a caracterizacao das tres abordagens--tecnica, politica e critica--, Reed (1997) argumenta que essas perspectivas necessitam de uma substancial reformulacao, por serem incapazes de perceber a realidade das praticas gerenciais com a devida profundidade, e propoe como alternativa a gestao como pratica social.

A perspectiva praxeologica torna possivel uma analise mais realista e flexivel da gestao nos niveis institucional, organizacional e comportamental, permitindo as interacoes entre a acao gerencial, a dinamica organizacional e o contexto macroestrutural, de forma a possibilitar um modelo teorico sistematizado das relacoes entre as tarefas de gestao, as estrategias de controle e os constrangimentos macroambientais (REED, 1997). Nesse enfoque, entende-se a vinculacao entre acao e estrutura, esta ultima concebida em sua dualidade estrutural (GIDDENS, 1998). Trata-se de uma abordagem da gestao como "pratica social" capaz de integrar diversos dilemas, aos quais as organizacoes e seus gestores estao submetidos no seu dia a dia.

4.1. A pratica social no Terceiro Setor

Na otica do modelo de analise de gestao proposto por Reed (1997:3), a gestao e uma pratica social, ou seja, "[...] um conjunto de atividades interrelacionadas e de mecanismos que organizam e regulam a atividade produtiva no trabalho" e que proporcionam "uma melhor compreensao dos processos e das estruturas atraves dos quais se mobiliza o poder e se efetua o controle". Nessa concepcao, a gestao deixa de ser analisada como uma estrutura formal de sistemas e controles, e passa a ser vista como uma estrutura contextualizada de relacoes sociais que visa a continua articulacao de praticas complexas e diversificadas, de modo a assegurar a coordenacao e a integracao da interacao social. Dessa maneira, a gestao passa a ser visualizada pelas acoes desenvolvidas em conjunto, pelos objetivos ou problemas compartilhados, pela percepcao comum da funcao social das praticas executadas, pelos meios e recursos comuns utilizados para alcancar os objetivos e realizar seus projetos e pelas condicoes situacionais ou limitadoras das praticas e de seus membros. Essas cinco variaveis distintas, embora inter-relacionadas, da pratica social (REED, 1997) evidenciaram, nesta pesquisa, que a gestao do Terceiro Setor e uma pratica social.

4.2. Acoes comuns desenvolvidas pelos gerentes do Terceiro Setor

Segundo Reed (1997), a primeira variavel para a analise da gerencia de um segmento como uma pratica social e o fato de os gerentes e membros de uma determinada organizacao desempenharem atividades comuns no exercicio gerencial. As entrevistas revelaram que o gestor de uma organizacao do Terceiro Setor e um profissional que desenvolve algumas atividades inerentes a funcao gerencial, como o planejamento de suas acoes, a coordenacao de seus membros e o controle de processos. Mas observa-se tambem a existencia de atividades que sao especificas a cada instituicao e ao proprio setor, como o trabalho realizado na area social.

Verifica-se que as atividades dos gerentes pesquisados sao bastante diversificadas e abrangentes, mas identificam-se acoes comuns desempenhadas por esses gestores, como a gestao administrativa e a captacao de recursos. Essas acoes comuns sao compartilhadas por todos os gerentes que participaram desta pesquisa, cujos depoimentos exemplificam a rotina gerencial do gestor em estudo:
 Controlar fluxo de caixa, ser responsavel pela
 prestacao de conta, arquivos de documentos, geracao
 de documentos administrativos para prestar contas de
 servicos contabeis (e terceirizada toda a parte de
 contabilidade), contratacao e administracao de pessoal
 para o escritorio, estabelecimento de parcerias e
 doacoes, relacoes com o sindicato e com setor juridico
 tambem passam pelo escritorio. (G13)


O depoimento acima relata os aspectos formais das atividades diarias do gestor, no sentido da manutencao da organizacao enquanto organizacao que deve apresentar resultados.

Observa-se que a captacao de recursos para as organizacoes do Terceiro Setor pesquisadas e uma das exigencias mais complexas e um dos maiores desafios que um gerente enfrenta no exercicio gerencial, uma vez que o setor, alem de ter por objetivo e missao o social, nao visa lucros para seu funcionamento, mas necessita de recursos para sua sobrevivencia.
 Nesse caso nosso, aquilo que a gente sonha e quer
 realizar e e impedido, porque nao e facil gerenciar
 terceiro setor, principalmente por causa da questao
 financeira, objetiva, e da dependencia. A gente esta
 sempre dependente da captacao de recursos externos.
 (G5)


E importante enfatizar que as atividades administrativas do Terceiro Setor sao assemelhadas as atividades dos setores publico e privado, ou seja, sao funcoes comuns executadas pelos gerentes das organizacoes sociais, publicas e privadas. Outro ponto que merece destaque refere-se ao trabalho social: observa-se que, alem de ser considerado pelos gestores pesquisados uma atividade, uma particularidade, uma caracteristica que um modelo de gestao do setor deve ter e uma das diferencas em relacao a outras esferas, na realidade o trabalho social e tambem o objetivo de existencia dessas organizacoes, que indicam maneiras especificas de realiza-lo na sociedade.

Assim sendo, a primeira variavel proposta por Reed (1997) para identificar a gestao das organizacoes do Terceiro Setor de Belo Horizonte pesquisadas como um tipo especifico de pratica social evidencia que os gerentes dessas organizacoes possuem atividades comuns e caracteristicas dos proprios gestores, o que indica, na percepcao deles, que existe uma pratica social.

4.3. A interacao dos gerentes por meio dos objetivos e problemas compartilhados

Na percepcao de Reed (1997), essa e a segunda variavel de analise para a caracterizacao do exercicio gerencial de um segmento como uma pratica social. E necessario que os objetivos e problemas comuns promovam uma interacao entre os gerentes e seus colaboradores no setor em estudo. No caso especifico desses gestores, e como afirmam Falconer (2000) e Hudson (1999), o objetivo comum que permeia todas as organizacoes do Terceiro Setor e o social--que move todas suas atividades e sua gestao, constituindo-se em forca motriz das organizacoes do Terceiro Setor pesquisadas.
 Entao a particularidade e a questao social, este e o
 grande diferencial. Ela esta muito focada na questao
 social, e e isso o que a diferencia de outras
 organizacoes, privadas, publicas. (G6)


Na percepcao do gerente entrevistado, e necessario que haja uma identificacao e interacao dos gestores e seus colaboradores com a missao social do Terceiro Setor, pois as atividades desenvolvidas por essas organizacoes, sem essa interacao, nao seriam capazes de provocar as mudancas e promover o significado do trabalho para quem as recebe e os fins a que se propoem. E necessario que o gerente seja capaz de promover uma interacao entre os diversos publicos e, principalmente, com seus colaboradores.
 A principal dificuldade do terceiro setor, realmente, e
 voce ter um mesmo relacionamento com todos. Pois a
 maioria de nos nao vive exclusivamente dedicando-se
 a esse tipo de trabalho e ha essa dificuldade de exercer
 realmente o papel do colaborador que fica o tempo
 integral na organizacao enquanto o voluntario nao fica
 o tempo integral. (G15)


A interacao tambem e necessaria para que se promovam trocas de experiencias, de forma que os gestores possam buscar e oferecer solucoes para os problemas enfrentados na conducao da gestao das organizacoes do Terceiro Setor. Essa troca de experiencia entre gestores e seus colaboradores no trabalho social e uma pratica social que permite aos envolvidos aproveitar a experiencia de seus pares para a solucao de problemas.

Entretanto, a questao social, assim como constitui o objetivo comum de uma organizacao do Terceiro Setor--e, em funcao dela, os gerentes procuram interacoes com os publicos da organizacao para a troca de experiencias--, tambem constitui um dos principais problemas enfrentados pelos gerentes das organizacoes do Terceiro Setor pesquisadas. Observa-se um discurso comum dos membros dessas organizacoes de que somente permanecem na organizacao se o ideal social for compartilhado entre os publicos e a organizacao.
 O que acontece numa ONG e o seguinte: quem esta e
 nao esta sintonizado com o trabalho, nao fica. Entao, o
 que acontece as pessoas que estao trabalhando la, que
 sao empregados contratados, eles nao tem experiencia
 assim, vamos dizer, de situacoes de conflito. (G18)


Na percepcao dos gerentes entrevistados, a administracao do trabalho voluntario assume contornos identificados em momentos especificos na gerencia do Terceiro Setor. Verifica-se que o voluntariado e realmente um problema comum para todos os gestores entrevistados, seja aquelas organizacoes que ainda apoiam suas atividades no trabalho voluntario, seja as organizacoes que possuem poucos voluntarios ou ja nao tem nenhum voluntario na sua politica de pessoal.

Pode-se observar que 35% das organizacoes participantes da amostra nao utilizam a pratica do trabalho voluntario para a execucao de suas atividades; para 25% das organizacoes, esse tipo de politica de trabalho esta em processo de mudanca; 35% empregam parcialmente o voluntariado na realizacao de suas tarefas e apenas 5% ainda apoiam suas atividades em trabalho voluntario.
 Eu trabalho com voluntarios, mas cada um sabe o seu
 papel, sabe da sua importancia dentro da nossa
 entidade. Entao, se nao tiver esse entrosamento, se nao
 tiver um trabalho de equipe, nao flui, entao acaba.
 (G5)

 Nao trabalho com voluntarios. (G20)

 O voluntario e aquela pessoa que vem na hora que
 quer. E dificil voce conseguir um voluntario todos os
 dias, trabalhando naquela hora. A ONG ja chegou
 num patamar que tem que ter uma responsabilidade,
 um compromisso. Temos ainda muitos voluntarios que
 vem, que tem um compromisso, mas a maior parte nao
 e certo. (G11)


Os extratos acima retratam a realidade das organizacoes pesquisadas, revelando que, mesmo naquelas instituicoes em que o trabalho voluntario ainda existe, a relacao e complicada e gera tensao e inseguranca nos gerentes. Naquelas organizacoes onde se trabalha com o voluntario, pode-se perceber que ha um numero bastante reduzido de pessoas que realizam esse tipo de servico e por razoes bastante diversificadas, como: ter tempo disponivel e identificacao com o objetivo da instituicao, cumprimento de pena judicial e outras.

Outro problema apontado pelos entrevistados refere-se a dificuldade financeira que todas as organizacoes do Terceiro Setor enfrentam na sua pratica cotidiana. A essa dificuldade financeira, inerente a um tipo de organizacao caracterizada por valores nao economicos, os gerentes entrevistados associam a captacao de recursos, apontada pelos entrevistados como um dos desafios que mais atrapalham a gestao de qualquer instituicao do Terceiro Setor.
 Os maiores problemas com que realmente a gente lida
 e ... hoje a questao e mesmo de, de conseguir recursos
 financeiros, captar recursos e buscar apoio. Nos temos
 muitas ideias, vamos dizer que no terceiro setor as
 pessoas tem varios projetos, e financiamento para
 esses projetos e a dificuldade. (G16)

 Neste mundo competitivo, as ONGs vivem na corda
 bamba, fazendo malabarismo em cima de uma
 situacao muito complicada, a dos recursos humanos e
 financeiros. (G3)


Seguindo-se os elementos propostos por Reed (1997) para a identificacao da gestao como uma pratica social, pode-se afirmar que essa segunda variavel, que busca a integracao social por meio da resolucao de problemas e do alcance dos objetivos organizacionais comuns a um segmento no exercicio da funcao gerencial, contribuiu, na percepcao dos gerentes entrevistados, para a visualizacao da gerencia das organizacoes do Terceiro Setor como uma pratica social.

4.4. A percepcao dos gerentes sobre a funcao social das praticas que executam

Esta e a terceira variavel a ser examinada para a caracterizacao da gerencia de um segmento como uma pratica social. Para que a gestao do setor pesquisado seja considerada uma pratica social, e necessario que as percepcoes dos gerentes entrevistados sobre os resultados de suas atividades

desempenhadas sejam semelhantes. De acordo com Reed (1997), essa convergencia de percepcoes dos gerentes sobre os resultados das atividades que executam no dia a dia define o estabelecimento das funcoes gerenciais na sociedade como uma pratica social. Essa convergencia pode ser visualizada em dois fatores determinantes da caracterizacao da pratica social: a importancia da funcao gerencial e do gestor para o desenvolvimento de uma organizacao do Terceiro Setor e a questao social.

A respeito da importancia da funcao gerencial para uma organizacao do Terceiro Setor, verificouse que 95% dos gerentes consideram a gerencia fundamental, enquanto 5% acreditam que a funcao gerencial e essencial em todos os setores, independentemente de sua classificacao--1, 2 e 3 Setores. Depoimentos dos gerentes podem exemplificar essa importancia da funcao para o setor e demonstrar que a gerencia e realmente a direcao das atividades de uma instituicao do Terceiro Setor pesquisada, mas devidamente adaptada a sua realidade e contextualizacao.
 E de suma importancia. Porque, se nao tiver, a coisa
 nao anda, fica estagnada. Entao voce tem que fazer: e
 como se fosse uma empresa mesmo. Igual, no caso, eu
 trabalho com voluntarios, mas cada um sabe o seu
 papel, sabe da sua importancia dentro da nossa
 entidade. (G9)


Percebe-se que a funcao gerencial deixou de ser privilegio do setor publico ou do mundo dos negocios (FALCONER, 2000; HUDSON, 1999). Assim, verifica-se que os gerentes entrevistados possuem a consciencia da importancia da funcao gerencial e compreendem que a administracao tornou-se tao importante para o exito das suas acoes sociais quanto os proprios trabalhos sociais desenvolvidos. A funcao gerencial passou a ser considerada universal em todos os setores:
 Eu acho que nao e especificamente para o terceiro
 setor, eu acho que a funcao gerencial, e ai eu estou
 falando de gerencia e gerente, qualquer gestor,
 independentemente do grau, do nivel hierarquico que
 ele assuma, a referencia de gestao e muito importante.
 (G19)


Os entrevistados percebem que a funcao gerencial e fundamental para a gestao das organizacoes do Terceiro Setor, seja em razao da propria especificidade do setor, seja pela instabilidade das regras, dos trabalhos e das pessoas --membros, voluntarios e assistidos--envolvidas com a gestao, como expresso no primeiro extrato; no segundo, os gestores mostram estar preparados para se adaptar as excecoes do dia a dia da gestao.

A questao social e considerada por todos os gerentes entrevistados como a caracteristica e particularidade principal da gestao do Terceiro Setor que nao dificulta a evolucao e o desenvolvimento de sua gerencia. Percebe-se que este aspecto e apenas um diferenciador entre a pratica de gestao da esfera publica e a da privada. Os gestores compreendem que suas funcoes gerenciais seguem uma logica universal, mesmo considerando as peculiaridades do setor.
 Eu quero descobrir como e gerenciar uma organizacao
 sem fins lucrativos, mas que na verdade e uma
 organizacao como outra qualquer. O gerente acha que,
 por mais que tenha o lado dessa missao, que e
 fabulosa, e isso mostra muito o sentimento de muitas
 pessoas, na verdade e uma empresa que precisa de
 uma profissionalizacao como uma empresa qualquer.
 (G.17)

 O Terceiro Setor tem um diferencial: ele atua no
 social. E isso. Ele nao tem diferencas de empresas
 privadas e publicas. (G12)


Ao se analisarem os extratos das entrevistas acima, verifica-se que os gerentes entrevistados reforcam categoricamente que o que diferencia o Terceiro Setor dos 1[degrees] e 2[degrees] setores e a atuacao, a missao, a responsabilidade de realizar trabalhos no social, enquanto o que os aproxima sao basicamente as funcoes gerenciais.

Dessa forma, compreende-se que a gerencia de organizacoes do Terceiro Setor possui uma funcao social definida. Essa percepcao comum sobre os resultados das atividades exercidas caracteriza-se como uma pratica social da gerencia de organizacoes do Terceiro Setor de Belo Horizonte pesquisadas.

4.5. Meios e recursos comuns utilizados

Os meios e os recursos comuns utilizados para alcancar os objetivos tracados e realizar os projetos importantes e, para Reed (1997), a quarta variavel de analise que permite caracterizar as praticas gerenciais de um segmento como uma pratica social. Os dados revelaram que os gestores entrevistados utilizam o cumprimento do estatuto como meio comum para atingir seus objetivos e projetos.

Na percepcao dos gerentes entrevistados, como ja era previsto, o estatuto, por se tratar de uma das exigencias legais para a abertura de uma organizacao do Terceiro Setor, representa o guia das instituicoes, a referencia de todas as atividades e funcoes administrativas, juridicas e legais desenvolvidas pelas organizacoes, como demonstrado nos extratos das entrevistas:
 Nos temos uma referencia no cotidiano do trabalho,
 ele guia o trabalho da instituicao, ate porque e
 necessario existir um estatuto, por motivos legais.
 Voce precisa do estatuto para guiar-se, principalmente
 a equipe tecnica, que tem essa relacao maior. As
 pessoas que vao chegando para trabalhar na instituicao
 nos pedimos para ler o regimento interno. E
 impossivel a instituicao andar sem o estatuto. (G10)


No entanto, verifica-se que o grau de importancia desse documento para os gerentes entrevistados varia muito. Para alguns gerentes, significa apenas o documento de fundacao, o cumprimento de uma designacao da lei; para outros, sao as diretrizes e o instrumento necessarios a concretizacao de parceria com fontes de financiamento para a sobrevivencia da organizacao.
 Atualmente eu faco muito mais do que esta descrito,
 porque na epoca em que fizeram essa descricao, nem
 existia esta estrutura organizacional que existe hoje.
 Entao, na verdade, ela esta muito defasada. Eu acho
 que a gente deveria pegar todas as descricoes dos 4
 gerentes anteriores e transforma-las em uma atividade
 de um unico gerente. (G18)

 Como eu falei para voce, muita coisa acontece e, nao
 adianta, depende do momento, surgem algumas coisas
 que voce nem imagina que voce tem que fazer,
 entendeu? Surgem demandas a toda hora que nao
 estao previstas, mas que voce tem que resolver, dai a
 sua funcao de administradora para dirigir e coordenar
 essas coisas. (G2)


O estatuto, de acordo com o novo Codigo Civil apresentado por Alves e Delgado (2003), e um documento imprescindivel para o funcionamento de uma organizacao do Terceiro Setor, seja ela associacao, seja fundacao. Este documento possui algumas disposicoes estatutarias que sao exigidas legalmente, como: a denominacao, os fins, a sede, direitos e deveres, fontes de recursos para manutencao, modo de constituicao e funcionamento. Assim, verifica-se que este caminho legal, necessario e obrigatorio a todas as organizacoes do Terceiro Setor deve ser respeitado e seguido dentro dos limites da legislacao vigente.

O estatuto e o principal meio de fazer com que seus objetivos e projetos sejam cumpridos.

No entanto, mesmo que todas as disposicoes estatutarias descritas fossem realizadas para garantir o desempenho legal das organizacoes, nem sempre as diretrizes seriam praticadas da forma como foram discriminadas e planejadas. Ha gerentes que nao as seguem e outros que fazem muito alem do que foi estipulado pelo documento. Essa situacao parece ser comum nas praticas gerenciais de todas as organizacoes pesquisadas.

Torna-se necessario, entao, que os gerentes das organizacoes do Terceiro Setor pesquisadas concentrem seus esforcos em uma forma de obedecer as disposicoes estatutarias previamente estipuladas, ou de proceder as atualizacoes sempre que necessario, para cumprir as bases legais e acompanhar as transformacoes do setor. Um dos meios utilizados pelos gestores do Terceiro Setor para que seus objetivos comuns sejam cumpridos e o exercicio do controle sobre o cumprimento do estatuto.

Na percepcao dos gerentes entrevistados, o controle do cumprimento do estatuto e, portanto, um meio comum usado para alcancar seus objetivos. Assim o controle do cumprimento do estatuto nas praticas de gestao dos gerentes das organizacoes do Terceiro Setor de Belo Horizonte pesquisadas constitui o quarto fator especifico de pratica social.

4.6. Condicoes de sucesso e insucesso

As condicoes de sucesso e insucesso nas atividades de gerencia de um segmento podem ser classificadas como intrinsecas e extrinsecas, de acordo com Reed (1997), consistindo na quinta e ultima variavel de analise para a caracterizacao de uma pratica social em um segmento. A existencia dessas condicoes comuns determina a atuacao e a utilizacao dos recursos pelos componentes das organizacoes estudadas. As condicoes intrinsecas sao as formas pelas quais os gerentes se legitimam diante dos seus membros, e as extrinsecas podem ser vistas como o desempenho da organizacao no mercado.

No grupo das condicoes intrinsecas a gerencia do Terceiro Setor, um dos principais fatores de sucesso ou insucesso comuns na percepcao dos gerentes entrevistados e a gestao participativa que eles proprios assumem na gestao das organizacoes pesquisadas perante seus membros e assistidos. Esse fator, que anteriormente foi apontado como o modelo ideal e uma caracteristica essencial para o gerenciamento de organizacoes do Terceiro Setor, tambem foi citado por Motta (2003) como um dos quatro pilares do trabalho gerencial contemporaneo. Entretanto, essa gestao participativa so e reconhecida se o gerente desenvolver habilidades tecnicas, humanas e conceituais (KANTZ; KAHN, 1970), alem de flexibilidade, um componente fundamental a esta gestao, que proporciona a participacao de todos os envolvidos no processo de gerenciamento de organizacoes do Terceiro Setor.
 O modelo participativo foi escolhido como uma forma
 mais democratica de todo mundo estar participando.
 (G6)

 Eu lidero com muita flexibilidade, pois aqui em nada a
 gente pode ser muito duro. Se a gente for muito dura,
 voce nao consegue nem trabalhador direito, porque ele
 nao da conta, devido as exigencias e multiplicidade de
 desafios. (G2)


Os extratos das entrevistas exemplificam como um gerente de organizacoes do Terceiro Setor requer a participacao e envolvimento de todos os membros para a efetividade da gestao do Setor, seja na tomada de decisoes, seja na adocao de medidas necessarias para a orientacao da instituicao. Assim sendo, a gestao participativa, maleavel e flexivel e essencial a gestao do Terceiro Setor, como defendido por Ferreira et al. (2006), alem do trabalho de conscientizacao da importancia de seus pares em todo o processo gerencial da organizacao.

No grupo das condicoes extrinsecas para o sucesso e insucesso dos gerentes de organizacoes do Terceiro Setor, ressalta-se a importancia das parcerias com as fontes financiadoras no desempenho dessas instituicoes. Essa condicao e um dos grandes desafios e tambem uma das principais particularidades do Terceiro Setor, na percepcao dos gerentes entrevistados.
 Os meus parceiros tambem influenciam na minha
 gestao porque eles estao me ajudando a prestar meus
 servicos, porque no fundo no fundo eles estao me
 ajudando em tudo, eles entram com a mao de obra,
 com o financeiro. O meu sucesso nao so meu. Como e
 que eu pintei isso aqui, sozinha? Eu nao tinha verba
 para isso, e entao ela influenciou no sucesso da creche
 hoje. (G2)


O extrato evidencia que o sucesso de uma organizacao do Terceiro Setor esta associado as parcerias realizadas com as fontes financiadoras da instituicao, uma vez que esta condicao resulta na sua sobrevivencia, na melhoria da prestacao de servicos aos assistidos, no aumento de capacitacao dos recursos humanos e na atualizacao gerencial das organizacoes. Verifica-se que as fontes financiadoras sao essenciais a todas as organizacoes do Terceiro Setor, pois se estas dependessem somente do apoio do Poder Publico nao conseguiriam sobreviver e atender a grande demanda social do Pais.

Seguindo-se a concepcao de Souza (2003) e a partir das percepcoes dos gerentes, identifica-se que as parcerias, seja com orgaos publicos, seja com a iniciativa privada ou mesmo com outras ONGs, sao vivenciadas no dia a dia das organizacoes. Para uma estrutura simples e ate mesmo para organizacoes estruturadas, as parcerias sao vistas como positivas, a nao ser quando nao estao vinculadas a missao e aos objetivos da instituicao.

Identifica-se a existencia de condicoes de sucesso e insucesso comuns aos gerentes das organizacoes do Terceiro Setor de Belo Horizonte pesquisadas, as quais podem ser consideradas como intrinsecas ou extrinsecas a funcao do gestor. Ressalta-se no grupo das condicoes extrinsecas que uma parceria sadia e honesta contribui sensivelmente com o desempenho das organizacoes do Terceiro Setor. E um componente fundamental da pratica social dos gerentes nas instituicoes, pois, alem de constituir um dos fatores causadores da interacao entre membros das organizacoes pesquisadas, configurase como um dos problemas comuns e tambem um dos fatores de sucesso e insucesso da gerencia das organizacoes pesquisadas.

5. CONSIDERACOES FINAIS

Aspectos como voluntariado, parceria, estatuto e a propria gestao sao algumas das transformacoes presentes no contexto do Terceiro Setor nos ultimos anos. Algumas dessas questoes, como o estatuto, ainda nao sao muito percebidas como realidade em varias das organizacoes pesquisadas, o que tende a mudar em razao do crescimento da demanda social e da falta de recursos; outras, como o voluntariado e a parceria, encontram-se em um processo adiantado de mudanca. Mas o destaque das transformacoes no setor e a gestao, que se encontra em um movimento acelerado de busca pela profissionalizacao.

Verificou-se que o desenvolvimento da funcao gerencial e imprescindivel as organizacoes do Terceiro Setor, uma vez que, para que estas alcancem seus objetivos e executem seus projetos, e necessaria a profissionalizacao da sua gestao e principalmente de seus membros, que devem ser preparados para as adversidades e transformacoes e levados a enfrentar e a superar desafios gerenciais com posturas condizentes com a realidade social do Pais. Esse processo profissionalizante em que o setor se encontra vai em direcao da percepcao de Motta (2003) e dos gerentes de que eles comecam a desempenhar um papel fundamental e insubstituivel na articulacao de interesses e na garantia do alcance dos objetivos na dinamica organizacional do Terceiro Setor.

Conclui-se que, ao caracterizar a gerencia de organizacoes do Terceiro Setor de Belo Horizonte como uma pratica social de gestao, este exercicio se revela uma pratica social, atendendo aos cinco elementos da perspectiva praxeologica do modelo proposto por Reed (1997). Essa constatacao--fundamentada nas acoes e praticas que sao comuns a todos os membros, no compartilhamento de objetivos ou problemas que facilitam a interacao entre os membros, na percepcao comum da funcao social desempenhada, nos meios e recursos comuns utilizados para o alcance de objetivos e a realizacao de projetos, e na compreensao das condicoes de sucesso e insucesso comuns que determinam a atuacao profissional e a utilizacao dos recursos disponiveis--desenha uma pratica social para os gerentes de organizacoes do Terceiro Setor, com parametros de acoes e amparo que lhes possibilitam desempenhar suas funcoes gerenciais e sociais com eficiencia. Assim, este e um estudo que contribui para a construcao teorica da pratica gerencial do Terceiro Setor e para a atualizacao de gestores de organizacoes do Terceiro Setor.

Acredita-se que o sucesso do aperfeicoamento gerencial do setor somente sera possivel a partir do momento em que se estruturar uma profissionalizacao especifica do Terceiro Setor, possibilitada pela analise da gestao como pratica social. Isso nao significa que o individuo nao deva fazer, por exemplo, cursos tecnicos, graduar-se em Administracao, especializar-se na area do Terceiro Setor e buscar aperfeicoamento de suas habilidades, pois chegara determinado momento em que a gestao do setor vai requerer uma profissionalizacao particular e especifica, uma vez que a gestao do Terceiro Setor ja se comporta como uma pratica social, atendendo aos requisitos propostos por Reed (1997).

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Alexandra Carla Aguiar Antunes Soares

Mestre em Administracao pela Faculdade Novos Horizontes

E-mail: alexandracarlas@gmail.com

Marlene Catarina de oliveira Lopes Melo

Doutora em Ciencias das Organizacoes. Diretora da Faculdade Novos Horizontes e

Coordenadora do Mestrado em Administracao da Faculdade Novos Horizontes

E-mail: lenemelo@unihorizontes.br; diretoriageral@unihorizontes.br

Recebido em: 17/8/2009

Aprovado em: 20/9/2009

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