期刊名称:E-topia : Revista Electrónica de Estudos sobre a Utopia
电子版ISSN:1645-958X
出版年度:2011
期号:12
出版社:Universidade do Porto
摘要:Todo ato de criação é um ato utópico. Cada vez mais precisamos de uma cultura que nos arranque do sono do senso comum e que possa desenhar um horizonte de sonhos que desperte em nós o desejo de construir novas formas para o pensamento e para a vida. Tudo o que podemos fazer, o que podemos dizer, o que podemos pensar depende do ponto de horizonte que vem dar o foco necessário ao cenário da vida. Estes horizontes funcionam não só como mapas que orientam nosso movimento mas é o motor mesmo de nosso desejo de caminhar. Estes pontos não são sempre visíveis pois habitam o espaço do ideal. Sigmund Freud tentou construir esta geografia que buscava desenhar uma outra gramática de leitura para nossos atos. Revelava, assim, que nossas vidas tinham avessos, descontinuidades e zonas de sombras. A clássica metáfora de que o sujeito perdia a familiaridade em seu próprio corpo abriu uma cicatriz na imagem romântica da razão iluminista que não tinha mais a força de orientar as explicações sobre nosso agir. Foi necessário construir uma outra razão pois era preciso saber sobre a fenda que se abriu entre o pensar e o falar, entre o falar e o fazer, entre o pensar e o sentir. Por isso, de certa forma, podemos pensar que esta nova experiência que se constrói vai se aproximar muito mais do estilo barroco do que do estilo clássico. O Barroco introduz de forma definitiva no plano das formas a dimensão de descentramento do sujeito. O sujeito não pode ser mais representado pela forma perfeita da esfera como o fora durante muitos séculos. É esta forma que serviu de base a leitura do movimento dos astros. Claro, até surgir um Kepler que mostrou que, finalmente, o movimento dos planetas em torno do sol não se dava na forma do círculo mas da elipse. Produz-se aí um radical terremoto nos fundamentos do pensamento científico e religioso daquela época. Todos sabem que Kepler teve que pagar um preço caro pela verdade que comunicou e provou ao mundo. Severo Sarduy, num belíssimo ensaio sobre o Barroco, mostra que finalmente foi Kepler que trouxe a revolução no pensamento e não propriamente Copérnico que, poderia ser mais apropriadamente, nomeado como um reformista, pois, muito embora tenha tirado a terra da posição central, não abandonou a lógica da estrutura circular com um centro organizador e localizável. Se, como diz o escritor cubano Lezama Lima, o mar é barroco e a terra é clássica estamos muito mais mergulhados neste espaço em movimento que a representação dos oceanos nos traz. Podemos, portanto, afirmar que fundamentalmente toda cultura deve produzir um descentramento, provocando no sujeito algumas interrogações.