Este estudo antropológico investiga a experiência vivida das doenças bucais no contexto da pobreza no Nordeste brasileiro. Durante seis meses em 2004, foram conduzidas entrevistas etnográficas, narrativas e observação participante com 31 moradores do Dendê, comunidade de baixa renda em Fortaleza, Ceará, analisadas pelo método hermenêutico-dialético. Revelou-se que as precárias condições de vida dificultam priorizar o cuidado em saúde. Embora sofram da dor dentária, ir ao dentista é percebido com um luxo, não um direto do cidadão. O difícil acesso ao serviço e restauração de má qualidade, favorecem a extração dentária como mais resolutiva. A deterioração da saúde bucal é lamentada pelos moradores que buscam ajuda de clínicas populares, políticos e curandeiros. A experiência da doença dentária diferencia de acordo com a classe, deixa marcas bucais da iniqüidade e prejudica a auto-estima e inclusão social. "Tratar" os dentes da desigualdade nesse contexto exige aprofundar a compreensão dos determinantes sociais da saúde, reduzir injustiças no acesso aos serviços de qualidade, remover estigmas que desmoralizam e fortalecer a viva voz da comunidade frente às forças estruturais que afetam sua vida.
This anthropological study focuses on the experience of dental disease in the context of poverty in Northeast Brazil. For six months in 2004, ethnographic interviews, narratives, and participatory observation were conducted with 31 residents of the low-income Dendê neighborhood in Fortaleza, Ceará, and the results were analyzed using a hermeneutic-dialectic method. Precarious living conditions make healthcare a difficult priority. Even when individuals experience acute toothache, seeking dental care is perceived as a "luxury" rather than a citizen's right. Difficult access to services and poor-quality restorations favor tooth extraction as the most effective intervention. Local residents complain about their deteriorating oral health and seek help from substandard clinics, patronizing politicians, and traditional healers. In this context, dental disease differs according to social class, leaves the sequelae of inequality, jeopardizes self-esteem, and hinders social inclusion. Dealing with such inequality requires a deeper understanding of the social determinants of health, reducing injustices in access to quality care, eliminating stigma, and empowering community members to confront the structural forces affecting their lives.